Conselho Estadual de Educação Indígena do Amazonas elege pela primeira vez uma mulher para a sua presidência
Publicado por MENEZESVIRTUALEYE em 2023/06/27
Os novos presidente e vice-presidente do Conselho Estadual de Educação Indígena do Amazonas (Ceei-AM) foram escolhidos nesta terça-feira (27/06). A eleição foi realizada de maneira presencial, no Centro de Mídias de Educação do Amazonas (Cemeam) da Secretaria de Estado de Educação e Desporto Escolar, e também on-line, por meio do WhatsApp e pelo IPTV. No total, foram 32 conselheiros votantes, que elegeram a presidente Ivete Tukano e o vice-presidente Sebastião Solart para o próximo biênio.
Eleitos por 21 votos a 11, a presidente e o vice-presidente são dos povos Tukano e Kanamari, respectivamente. Primeira mulher eleita presidente após nove gestões masculinas, a professora Ivete Tukano destacou os principais objetivos da sua gestão em discurso de posse.
“Queremos agradecer a Tupã e aos nossos ancestrais, que sempre estão conosco. Este colegiado tem um grande compromisso com o Ceei-AM e com os alunos. Vamos trabalhar ouvindo toda a nossa base. Estamos muito felizes e agradecidos. Essa é uma vitória coletiva”.
A solenidade de posse da nova diretoria foi realizada pela secretária executiva adjunta Pedagógica, da Secretaria de Educação, Arlete Mendonça, que destacou a continuidade da atuação em conjunto entre o Ceei-AM e a Secretaria.
“Nos sentimos honrados e privilegiados pela nossa atuação em conjunto, que envolve as atividades da Gerência de Educação Escolar Indígena aqui da Secretaria. Continuamos à disposição, pelos nossos alunos. A missão continua”.
Atuação do Ceei-AM
Responsável pela fiscalização das pautas referentes aos alunos indígenas, é o Ceei-AM que assessora as equipes da Secretaria de Educação e estabelece o contato entre as comunidades, líderes e representantes escolares.
“O pleito de hoje é muito importante, porque marca um novo momento. O nosso Conselho é normativo, ou seja, a gente que organiza nossa própria atuação, entre nossas discussões internas. Um dos nossos principais objetivos é transformar o Conselho em legislação, o que nos daria mais tranquilidade para realizar nosso trabalho”, explicou a secretária executiva do Ceei-AM, Jeana Medeiros, do povo Baré.
Em 2023, a Secretaria de Educação conta com mais de 10 mil alunos indígenas matriculados nas unidades de ensino rede estadual.
Uma trajetória de trabalho na educação escolar indígena, a experiência de Gilvan M. de Oliveira
Em 2013, o professor Gilvan M. de Oliveira, fundador do IPOL (Instituto de Investigação e Desenvolvimento em Politicas Linguisticas), e então a frente do IILP (Instituto Internacional de Língua Portuguesa) como Diretor Executivo, participou de uma entrevista com o Prof Lino João de Oliveira Neves – Departamento de Antropologia UFAM, fazendo um recorte histórico a partir do primeiro processo de cooficialização de língua a nível municipal quando em 2002, São Gabriel da Cachoeira no Amazonas cooficializou três das línguas faladas no seu território a partir de uma lei ordinária da Câmara de Vereadores: o baniwa, o nheengatu e o tukano, criando assim uma via nova e uma tecnologia social para o reconhecimento do multilinguismo brasileiro.
Gilvan comenta que “a cooficialização de línguas em nível municipal, através de lei promulgada pela câmara de vereadores, é um verdadeiro movimento social no Brasil que conta já com 22 línguas oficializadas em 51 municípios, 13 línguas indígenas e 9 línguas alóctones ou de imigração, em onze estados brasileiros nas regiões norte, centro oeste, sudeste e sul (dados de 2022)”.
Assista a sequencia de 6 vídeos com Gilvan Mûller de Oliveira, Trajetórias na Educação Bilíngue Intercultural Indígena
- Parte 1: Reconhecimento da diversidade linguística do Rio Negro e no Brasil https://youtu.be/cJikLQ1IBzM
- Parte 1: Reconhecimento da diversidade linguística do Rio Negro e no Brasil (Continuação) https://youtu.be/x06Qtw3Qg04
- Parte 2: Vitalidade linguística e promoção do conhecimento https://youtu.be/z4_onKt6HDk
- Parte 2: Vitalidade linguística e promoção do conhecimento (Continuação) https://youtu.be/RMo9BcY7Ebo
- Parte 3: Línguas locais e os desafios da educação diferenciada https://youtu.be/jNRKRBiFPxU
- Parte 3: Línguas locais e os desafios da educação diferenciada (Continuação) https://youtu.be/GFP_bV5QUrA
Para conhecer a Universidade Federal da Amazônia e a Licenciatura, visite as páginas abaixo:
Universidade Federal do Amazonas – UFAM Instituto de Ciências Humanas e Letras – ICHL
Licenciatura Indígena Políticas Educacionais e Desenvolvimento Sustentável
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Saiba mais sobre Gilvan M. de Oliveira nesta entrevista publicada na página da Revista Virtual de Estudos da Linguagem – ReVEL (http://www.revel.inf.br/pt),
edição número 14 (http://www.revel.inf.br/pt/edicoes/?id=41)
Link para a entrevista: http://www.revel.inf.br/files/e92f933a3b0ca404b70a1698852e4ebd.pdf
Demarcação de territórios é prioridade da Funai, diz Joenia Wapichana
“Umas das prioridades do plano de trabalho é novamente fazer com que os processos de demarcação de terras indígenas andem e é uma questão que nosso presidente Lula já anunciou que quer dar prioridade”, disse Joenia Wapichana em entrevista ao programa Brasil em Pauta, que vai ao ar neste domingo (11), na TV Brasil.
A presidente da Funai detalhou a importância da demarcação de uma terra indígena e os impactos para os povos que vivem nela. “Essa terra serve pra prover a vida dos povos indígenas. Sempre tenho dito que, a partir do direito à terra é que vem outros direitos sociais, que vem a saúde, educação, a forma de mantermos a cultura, faz com que a gente conserve e faça esse repasse dos conhecimentos tradicionais para que continuem as línguas indígenas, para que possa ter condições de os povos indígenas desenvolverem seus próprios projetos de sustentabilidade”, explica.
De acordo com Joenia Wapichana, os números mostram que há avanços nos processos de demarcação. “Em quatro meses, a Funai já fez andar mais de 30 processos de demarcações de terras indígenas”.
No final de abril, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou decretos de homologação de seis terras indígenas, durante o encerramento do Acampamento Terra Livre 2023, em Brasília. Os processos estavam parados desde 2018.
Preservação
A contribuição dos povos indígenas para a preservação ambiental foi destacada por Joenia Wapichana. Segundo ela, o que os povos indígenas conservam de biodiversidade e floresta em pé contribui para amenizar efeitos de problemas climáticos.
“Os povos indígenas têm uma capacidade de mostrar umas formas mais sustentáveis para contribuir inclusive para essa crise climática que o mundo atravessa. Temos discutido formas sustentáveis de fazer com que o mundo todo se preocupe e os povos indígenas têm feito sua contribuição com suas boas práticas, com seus conhecimentos tradicionais, manejos sustentáveis”, detalhou.
Tema que atualmente mobiliza atenção dos povos indígenas, a discussão sobre o marco temporal para demarcação de territórios no país é classificada pela presidente da Funai como inconstitucional por desconsiderar o direito originário dos povos indígenas. “Quando nossa Constituição finalmente passa a reconhecer os direitos indígenas, ela também traz uma preocupação de reconhecer os direitos originários, então colocamos isso como uma contradição a nossa Constituição”.
De acordo com Joenia, o Artigo 231 da Constituição Federal registra que são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
Está em julgamento no Supremo Tribunal Federal se as demarcações de terras indígenas devem seguir o chamado marco temporal, tese de que indígenas só têm direito às terras que já eram tradicionalmente ocupadas por eles no dia da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988. Por essa tese, as áreas sem a ocupação de indígenas ou com a ocupação de outros grupos neste período não estão sujeitas à demarcação.
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A última entrevista de Guimarães Rosa
POR CARLOS WILLIAN LEITE EM ENTREVISTAS
Publicada em Revista Bula
Eis o homem. O homem que em menos de 20 anos, com sua prosa, seu estilo, sua literatura — sem os favores profissionais da medicina, que pode dar saúde mas ainda não deu gênio (cf. alguns prêmios Nobel), conquistou o Brasil, Portugal, a Alemanha, a Itália, os Estados Unidos, o mundo, não? Repara no corpo: mau grado as ligeiras ameaças de obesidade, parece atleta, cavaleiro que foi, ou de bandeirante, que da língua é. Vê como está sobriamente elegante, distinto, sorridente, calmo, aristocrata, como convém a um embaixador (ou não estivéssemos num salão do Itamarati). Mas nada da pose ou dos gestos artificiais com que outros tentam iludir a mediocridade. Quem esperou quase quarenta anos para publicar o primeiro livro, ou quem avançou sozinho pelos grandes sertões da língua, não precisa ter pressa nem pedir emprestado um corpo, uma casaca, máscaras.Lá está o lacinho (ou gravata-borboleta, meu chapa?) simetricamente impecável, fazendo pendant com os óculos claros, tão claros que ainda esclarecem mais os olhos sempre inquiridores, atentos. E é curioso como um mineiro de Cordisburgo, a dois passos (brasileiros) da Itabira de Drummond, gosta, ao contrário deste (à primeira vista), de falar, de contar, de ser ouvido. Até nisso parece grande o seu amor à língua. Mal me sentei, já ele me começou a falar de Portugal e de escritores portugueses…
Guimarães Rosa — Estive em Portugal três vezes. Na primeira, em 1938, passei lá apenas um dia; ia a caminho da Alemanha. Na segunda, em 1941, passei lá quinze dias, em cumprimento de uma missão diplomática que me fora confiada em Hamburgo. Na terceira, em 1942, passei um mês, pois estava já de regresso ao Brasil, por causa da guerra.
Durante essas estadas, travou relações ou conhecimentos com alguns escritores?
Guimarães Rosa — Não. Até porque eu ainda não era “escritor” (“Sagarana”, com efeito, só foi publicado em 1946) e o que me interessava mais era contatar com a gente do povo, entre a quais fiz algumas amizades. Gosto muito do português, sobretudo da sua integridade afetiva. O brasileiro também é gente muito boa, mas é mais superficial, é mais areia, enquanto o português é mais pedra. Eu tenho ainda uma costela portuguesa. Minha família do lado Guimarães é de Trás-os-Montes. Em Minas o que se vê mais é a casa minhota, mas na região em que eu nasci havia uma “ilha” transmontana.
Mas não chegou a conhecer Aquilino?
Guimarães Rosa — Conheci Aquilino (Aquilino Ribeiro), mas acidentalmente. Eu entrei numa livraria, não sei qual, do Chiado (presumo que a Bertrand) e, quando pedi alguns livros dele, o empregado perguntou-me se eu queria conhecê-lo, pois estava ali mesmo. Respondi que sim, e desse modo obtive dois ou três autógrafos de Aquilino, com quem conversei alguns instantes. Voltei a estar com ele, mais tarde, num jantar que lhe foi oferecido enquanto de sua vinda ao Brasil. Mas ele, naturalmente, não se recordava de mim (porque eu não me apresentara como escritor), e eu também não lhe falei do assunto.
Não sabe que, justamente numa crônica motivada pela sua ida ao Brasil, Aquilino colocou o seu nome, logo em 1952, ao lado dos de José Lins do Rego, Gilberto Freyre, Graciliano Ramos, Manuel Bandeira, Jorge de Lima e Agripino Grieco, que, segundo ele, eram os “notáveis escritores e poetas” que estavam a “encostar a pena contra a lava” que ia no Brasil “sepultando prosódia e morfologia da língua-mater”? Eu creio mesmo que é essa uma das primeiras referências ao seu nome, em Portugal…
Guimarães Rosa — Não sabia dessa curiosa referência do Aquilino. Antes dessa, porém, há uma referência a mim numa publicação do Consulado do Porto, de 1947, feita por não sei quem. Sei de outra referência feita, anos depois, salvo erro, por um irmão de José Osório de Oliveira.
Voltando a Aquilino: acha que recebeu alguma influência dele? Já, pelo menos, um crítico, o mineiro Fábio Lucas, notou alguns “pontos de contato nada desprezáveis” entre a sua obra e a de Aquilino.
Guimarães Rosa — Eu gosto de Aquilino, sobretudo da “Aventura Maravilhosa”, mas não creio que dele tenha recebido alguma influência, a não ser na medida em que sou influenciado por tudo o que leio. A verdade é que antes de 1941 só conhecia de Aquilino um ou dois trechos, como infelizmente ainda hoje sucede em relação à quase totalidade dos escritores portugueses vivos. E, como sabe, “Sagarana”, foi escrito em 1937.
Um garçom do Itamarati entra com um copo de água, e pergunta se precisa mais alguma coisa. Guimarães Rosa agradece e diz: Vá com Deus, como se fosse um beirão ou um transmontano. Mais uma razão, portanto, para eu prosseguir: Como encara ou explica o enorme prestígio de que goza nos meios intelectuais e universitários portugueses?
Guimarães Rosa — Em relação a mim, houve por aqui (no Brasil) muitos equívocos, que ainda hoje não desapareceram de todo e que, curiosamente, ao que parece, não houve em Portugal. Pensaram alguns que eu inventava palavras a meu bel-prazer ou que pretendia fazer simples erudição. Ora o que sucede é que eu me limitei a explorar as virtualidades da língua, tal como era falada e entendida em Minas, região que teve durante muitos anos ligação direta com Portugal, o que explica as suas tendências arcaizantes para lá do vocabulário muito concreto e reduzido. Talvez por isso que ainda hoje eu tenha verdadeira paixão pelos autores portugueses antigos. Uma das coisas que eu queria fazer era editar uma antologia de alguns deles (as antologias que existem não são feitas, como regra, segundo o gosto moderno), como Fernão Mendes Pinto, em quem ainda há tempos fui descobrir, com grande surpresa, uma palavra que uso no “Grande Sertão”: amouco. E vou dizer-lhe uma coisa que nunca disse a ninguém: o que mais me influenciou, talvez, o que me deu coragem para escrever foi a” História Trágico-Marítima” (coleção de relatos e notícias de naufrágios, acontecidos aos navegadores portugueses, reunidos por Bernardo Gomes de Brito e publicados em 1735). Já vê, por aqui, que as minhas “raízes” estão em Portugal e que, ao contrário do que possa parecer, não é grande a distância “linguística” que me separa dos portugueses.
Eu penso até que na imediata e incondicional adesão portuguesa a Guimarães Rosa há muito de transferência sublimada de uma frustração linguística nossa, coletiva, que vem pelo menos desde Eça. Mas não nos desviemos. Admira-me muito que não tenha citado nenhum livro de cavalaria, nem nenhuma novela bucólica, pois pensava que deles e delas havia diversas ressonâncias na sua obra, sobretudo no “Grande Sertão: Veredas”…
Guimarães Rosa — Sim, li muitos livros de cavalaria quando era menino, e, por volta dos 14 anos, entusiasmei-me com Bernardim (Bernardim Ribeiro), e depois até com Camilo. Ainda continuo a gostar de Camilo, mas quem releio permanentemente é Eça de Queiroz (quando tenho uma gripe, faz mesmo parte da convalescença ler “Os Maias”; este ano já reli quase todo “O Crime do Padre Amaro” e parte da “Ilustre Casa de Ramires”). Camilo, leio-o como quem vai visitar o avô; Eça, leio-o como quem vai visitar a amante. Quando fui a Portugal pela primeira vez, eu só queria comidas ecianas (que gostosura, aquele jantar da Quinta de Tormes). Aliás deixe-me que lhe diga que me torno muito materialista quando penso em Portugal; penso logo nos bons vinhos, nas excelentes comidas que há por lá. E talvez seja também por isso que se há um país a que eu gostaria de voltar é Portugal…
… que, naturalmente, o receberá de braços abertos, em festa. Mas permita-me ainda uma pergunta: como “enveredou” — e penso que a palavra se ajusta bem ao seu caso — pelo campo da “invenção linguística?
Guimarães Rosa — Quando escrevo, não penso na literatura: penso em capturar coisas vivas. Foi a necessidade de capturar coisas vivas, junta à minha repulsa física pelo lugar-comum (e o lugar-comum nunca se confunde com a simplicidade), que me levou à outra necessidade íntima de enriquecer e embelezar a língua, tornando-a mais plástica, mais flexível, mais viva. Daí que eu não tenha nenhum processo em relação à criação linguística: eu quero aproveitar tudo o que há de bom na língua portuguesa, seja do Brasil, seja de Portugal, de Angola ou Moçambique, e até de outras línguas: pela mesma razão, recorro tanto às esferas populares como às eruditas, tanto à cidade como ao campo. Se certas palavras belíssimas como “gramado”, “aloprar”, pertencem à gíria brasileira, ou como “malga”, “azinhaga”, “azenha” só correm em Portugal — será essa razão suficiente para que eu as não empregue, no devido contexto? Porque eu nunca substituo as palavras a esmo. Há muitas palavras que rejeito por inexpressivas, e isso é o que me leva a buscar ou a criar outras. E faço-o sempre com o maior respeito, e com alma. Respeito muito a língua. Escrever, para mim, é como um ato religioso. Tenho montes de cadernos com relações de palavras, de expressões. Acompanhei muitas boiadas, a cavalo, e levei sempre um caderninho e um lápis preso ao bolso da camisa, para anotar tudo o que de bom fosse ouvido — até o cantar de pássaros. Talvez o meu trabalho seja um pouco arbitrário, mas se pegar, pegou. A verdade é que a tarefa que me impus não pode ser só realizada por mim.
Guimarães Rosa vai buscar uma fotografia para me mostrar onde levava o caderninho de notas, nas boiadas: vai buscar uma pasta com a correspondência com um seu tradutor norte-americano, para me mostrar as dúvidas e dificuldades deste, e o trabalho, a seriedade e a minúcia com que as vai resolvendo uma por uma (escrevendo, ele próprio, preciosas autoanálises estilísticas ou considerações filológicas). E, entretanto, vai-me fazendo outras confissões interessantes. Por exemplo: “gosto das traduções que filtram. Da tradução italiana do Corpo de Baile gosto mais do que do original.” Ou: “Estou cheio de coisas para escrever, mas o tempo é pouco, o trabalho é lento, lambido, e a saúde também não é muita.” Ou: “Não faço vida literária: como regra, saio daqui e vou para casa, onde trabalho até tarde.” Ou: “No próximo ano, vou publicar um livro ainda sem título, com 40 estórias” (que têm aparecido quinzenalmente, no jornal dos médicos “O Pulso”, onde frequentemente aparecem também cartas ou a atacá-lo ou a defendê-lo ferozmente). Ou ainda: “eu não gosto de dar, nem dou entrevistas. Tenho sempre a sensação de que não disse o que queria dizer, ou que disse mal o que disse, ou que criei maior confusão; e não estou assim tão seguro do que procuro e do que quero. Com você abri uma exceção…”.
Nota: Entrevista realizada pelo escritor e jornalista Arnaldo Saraiva, em 24 de novembro de 1966. Publicada no livro “Conversas com Escritores Brasileiros”, editora ECL em parceria com o Congresso Portugal-Brasil.
Lançamento: NJINGA e SEPÉ: Revista Internacional de Culturas, Línguas Africanas e Brasileiras
Os estudos que ensejaram a publicação desta edição são resultados de abordagens variadas de pesquisas de naturezas qualitativas, quantitativas e mistas, com métodos que envolvem pesquisa bibliográfica, pesquisa de campo e análises de dados. São muitos os ganhos desta Edição Especial I. Muitos desses estudos são enriquecidos de dados históricos robustos acerca das modalidades da educação (básica, secundária, técnica e superior) – desde os tempos da colônia até os dias atuais. Além dos dados históricos acerca da educação, muito se dá a conhecer também acerca da linguagem e da cultura tantos dos países africanos quanto do Brasil. É assim que esta edição se converte em uma leitura avaliativa e crítica da evolução da educação, da cultura, das tradições, das línguas e da política. É assim que a publicação dos textos que compõem esta edição especial se converte, enfim, em um turno de fala, no diálogo do conhecimento científico com a sociedade africana e brasileira.
Organizadores:
Prof. Dr. Antônio Félix de Souza Neto (Universidade Federal de Sergipe)
Prof. Dr. Alexandre António Timbane (Universidade Federal de Sergipe/Universidade de Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira)
Acesse a publicação: https://revistas.unilab.edu.br/index.php/njingaesape/issue/view/47
Povo krahô vence em Cannes
80 anos após massacre liderado por fazendeiros, povo krahô vence em Cannes.
Por Peu Araújo – Colaboração para Ecoa, em São Paulo (SP) em 27/05/2023
Dirigido por Renée Nader Messora e João Salaviza, o longa-metragem “A Flor do Buriti” ganhou nesta sexta-feira (26 de maio) o Prix d’Ensemble, prêmio destinado a melhor equipe, no Festival de Cannes de 2023. O filme estreou em Cannes nesta terça-feira (23) com aplausos da plateia que duraram mais de 10 minutos.
“O festival está fazendo uma sinalização de que é importante trazer também para esse espaço um debate sobre como a gente vai continuar vivendo nessa terra. Não é só o nosso filme que é feito com indígenas, tem vários filmes nessa seleção e isso é um sinal de que realmente os olhos estão voltados para a situação do planeta, porque esses povos no fim das contas são quem estão segurando a queda do céu, como diz o (Davi) Kopenawa”
Renée Nader Messora, diretora de “A Flor do Buriti”.
Massacre Krahô em 1940
O longa-metragem traz a urgência de dois temas: a luta pela terra e as diferentes formas de resistência implementadas pela comunidade Krahô, localizada no Tocantins. O filme retrata também a história do massacre causado por fazendeiros na comunidade Krahô, em 1940. Segundo registros, dezenas de pessoas foram mortas.
“Tem essa história que traz uma emoção real e uma tristeza real para as próximas gerações. Está vivo, nós vamos levar isso para a comunidade, eles vão assistir com nós. Todo mundo vai chorar, todo mundo com certeza vai se emocionar e chorar, porque é a realidade que nós estamos mostrando”, diz Francisco H?jnõ Krahô, que atua no longa-metragem e trabalha na equipe de segurança da comunidade. H?jnõ fala ainda sobre a importância do filme: “A imagem é uma história. Sem a imagem ninguém vai ver a história, porque os mais jovens vão assistir ao filme e as imagens vão dizer que isso realmente aconteceu. O vídeo vai afirmar. ‘Sim, aconteceu sim’. A gente não tinha nascido, não tinha reconhecimento. O filme traz isso, traz essa informação pra gente.”
Criação com os Krahô
Para a realização do longa-metragem, os diretores Renée Nader Messora e João Salaviza exerceram diariamente o diálogo com a comunidade Krahô. Ao todo, foram 15 meses de filmagem. “O filme vai se construindo junto, na nossa relação, das coisas que a gente vai vivendo”, conta a diretora. A relação de Renée com a comunidade Krahô é muito mais antiga do que a gravação de “A Flor do Buriti ” e vai muito além do cinema. Ela explica: “O filme é uma consequência da nossa vida. O nosso projeto é muito mais um projeto de vida do que um projeto artístico. Em 2012 eu saí de São Paulo, aluguei uma casa em Itacajá, no Tocantins, e desde então é o lugar onde eu passo a maior parte do meu tempo”. Antes de retratar a vida dos Krahôs, Renée estabeleceu uma relação de troca com a comunidade com oficinas de técnicas audiovisuais. E dessas oficinas vieram os exercícios práticos.
“Eles entenderam primeiro que eles poderiam registrar festas, histórias, mitos, uma cantiga que só um idoso sabia, aquela memória poderia ser reativada no futuro. A coisa começou assim.”
Durante o projeto, a comunidade Krahô, com a ajuda de Renée e de outros membros da equipe, fez o seu próprio jornal. Toda semana uma pauta é definida e as gravações acontecem. E toda sexta-feira à noite eles projetavam o jornal para toda a aldeia. Protestos em Cannes Nesta quarta-feira (24), a equipe do filme “A Flor do Buriti” fez um protesto contra o Marco Temporal no tapete vermelho do Festival de Cannes. Com uma faixa escrito “o futuro das terras indígenas no Brasil está sob ameaça”, seguido da frase “não ao Marco Temporal”, a equipe cerrou os punhos e chamou a atenção para a votação que acontece no Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 7 de junho.
“O protesto foi importante para mim e para o meu povo. A minha preocupação não é só com o meu povo, é com parentes do Brasil inteiro. Esse protesto vai ser importante para que os parlamentares reflitam e pensem numa forma de não levar isso para a frente. Tem que dialogar”, afirma Francisco H?jnõ Krahô Esse não é o primeiro protesto que esta equipe faz em Cannes. Em 2018, no início do governo Bolsonaro, foram até Cannes falar em defesa da demarcação de terras. “Não tem outra razão para estarmos ali no tapete vermelho se não for assim”, conclui Renée.
Leia na fonte: https://www.uol.com.br/ecoa/ultimas-noticias/2023/05/27/80-anos-apos-massacre-liderado-por-fazendeiros-povo-kraho-vence-em-cannes.htm