O II ENMP visa aprofundar as discussões sobre os desafios da cooficialização de línguas com especial atenção às etapas seguintes à aprovação da lei municipal: a regulamentação e a implementação. Florianópolis, 1 e 2 de setembro. Participem!
O Instituto Ibero-americano de Línguas Indígenas (IIALI) iniciou suas atividades com o objetivo de enfrentar as ameaças que espreitam as mais de 550 línguas indígenas que ainda são faladas na América Latina e no Caribe, assim como o de promover seu uso, preservação, revitalização, incentivo e desenvolvimento.
O lançamento dessa iniciativa ocorreu durante a reunião do Primeiro Conselho Intergovernamental do IIALI, da qual participaram representantes da Bolívia, da Colômbia e do México, países com plenos direitos à iniciativa; o Equador, El Salvador, a Guatemala, a Nicarágua, o Panamá, o Paraguai e o Peru participaram como convidados. Além dos países, o Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e do Caribe (FILAC), a Secretaria-Geral Ibero-Americana (SEGIB) e a Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, Ciência e Cultura (OEI) também estavam presentes.
Na reunião, foram eleitas por consenso as três primeiras presidências desta entidade que definirá os trabalhos do IIALI, cada uma por um período de 2 anos, sem reeleição imediata. A Bolívia, a Colômbia e o México irão assumir alternadamente a presidência desse mecanismo de governança. A Bolívia irá assumir a presidência do IIALI de 2022 a 2024, seguida pela Colômbia e, depois, pelo México.
Rogelio Mayta, ministro das Relações Exteriores do Estado Plurinacional da Bolívia, agradeceu aos demais países pela confiança depositada em seu país, tanto para exercer a primeira presidência, quanto pelo fato de que a sede permanecerá na Bolívia.
“Agradecemos a confiança depositada em nós, embora tenhamos claro que somos uma articulação de povos, com uma visão de mundo inclusivo, e que enfrentaremos qualquer trabalho e desafio que tenhamos no futuro como fazem nossos povos originários: de forma coletiva, pensando mais em nós do que na individualidade”, afirmou Mayta.
A Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou a Década Internacional das Línguas Indígenas 2022-2032, com o objetivo de chamar a atenção para a perda irreparável das línguas indígenas, além da necessidade imediata de conservá-las, revitalizá-las, promovê-las e de adotar medidas urgentes ao nível nacional e internacional.
Nesse contexto, a iniciativa visa conscientizar sobre a situação das línguas indígenas, assim como os direitos culturais e linguísticos dos Povos Autóctones, promovendo a transmissão, o uso, o aprendizado e a revitalização das línguas indígenas.
Da mesma forma, o Instituto pretende prestar assistência técnica na formulação e na implementação de políticas linguísticas e culturais para os povos autóctones, e facilitar a tomada de decisões informadas sobre o uso e a força das línguas indígenas.
História foi adaptada de mito bororo analisado pelo antropólogo Claude Lévi-Strauss
A Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) lançou neste mês de fevereiro um jogo digital baseado na narrativa mítica do povo indígena bororo “As araras e seu ninho”. O jogo, gratuito e destinado a crianças de 5 a 9 anos, pode ser acessado e conta, ainda, com um tutorial especialmente elaborado para possível utilização em salas de aula de Educação Infantil e do Ensino Fundamental I.
O jogo, intitulado “Jeriguigui e o Jaguar na terra dos bororos”, foi criado pelo Grupo de Pesquisa Leetra – Linguagens em Tradução da UFSCar, que desenvolve projetos relacionados à questão indígena. O grupo é vinculado ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e coordenado por Maria Sílvia Cintra Martins, professora sênior do Departamento de Letras (DL) da Universidade.
O roteiro do jogo foi desenvolvido pela professora com base principalmente no mito M1 bororo: “O xibae e iari” (“As araras e seu ninho”), que se encontra nas páginas 57 a 59 do volume “Mitológicas 1: O cru e o cozido”, de autoria do antropólogo francês Claude Lévi-Strauss, que desenvolveu pesquisa no Brasil na década de 1930. “Essa narrativa mítica trata da vingança empreendida pelo pai de um jovem indígena, que teria cerca de onze anos estando prestes a participar de um ritual de iniciação. O pai faz com que o jovem passe por vários desafios, até largá-lo no alto de uma encosta onde poderia ter se submetido à morte, seja por inanição, seja atacado por animais selvagens, mas o jovem supera todos os desafios e consegue voltar para a aldeia”, conta Maria Sílvia Martins.
Ao avançar nas fases, o jogador se depara com elementos da narrativa bororo e vivencia os desafios enfrentados pelo protagonista Jeriguigi. “A história de Jeriguigui envolve o comportamento punitivo de seu pai, que o obriga a passar por três desafios que poderiam ter sido mortais, se não fosse a interferência de sua avó materna. Não satisfeito, o pai exige que Jeriguigui vá capturar ararinhas na encosta de uma montanha, e puxa a escada deixando o menino indefeso e sujeito a dois grandes problemas: o encontro com os gaviões-de-cabeça-vermelha, que lhe dão muitas bicadas, e o encontro com o jaguar, a onça-pintada, com quem faz um tipo de barganha”, detalha a docente da UFSCar.
Nome do jogo
O título do jogo “Jeriguigui e o Jaguar na terra dos bororos” enfoca dois termos específicos da linguagem indígena. A professora da UFSCar explica que o nome Jeriguigui aparece no mito com a referência ao grupo ou clã ao qual o menino indígena pertencia, o clã do jabuti. “No mito M7 ‘Kayapó-Gorotire: origem do fogo’, que utilizei de forma complementar, a onça ou jaguar possui o papel de ser quem fornece o fogo para os indígenas. As narrativas míticas dos povos indígenas brasileiros funcionam muitas vezes de forma complementar, de modo que podemos encontrar num mito elementos que completam o outro e que também fazem parte dessa outra cultura”, explica.
“Escolhido o mito, transformei-o em roteiro rico em diálogos em que inseri vários animais – alguns em extinção – que vão fornecendo diversas informações sobre os indígenas brasileiros, suas línguas e suas culturas. Juntamente com seis pesquisadores do Grupo de Pesquisa Leetra, gravamos as falas dos personagens que depois foram legendadas. O próximo passo foi o trabalho do desenhista Hugo Cestari e de uma empresa especializada em jogos, que transformaram meu roteiro em belas imagens, em que os diálogos são acompanhados de jogos e desafios envolventes para crianças de cinco a nove anos, para quem o jogo foi idealizado”, complementa a docente. Toda a montagem do jogo contou com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp – Projeto 2019-07879-4).
Escolas
O jogo está disponível na versão do Windows – para computadores, notebooks e tablets – no site. Há a previsão, para os próximos seis meses, do lançamento das versões iOS e Android. “Na hora de baixar o jogo, sugerimos que professores da Educação Infantil e do Ensino Fundamental I baixem também um texto de 40 páginas elaborado por mim, que se encontra no mesmo espaço e traz orientações e sugestões para sua utilização em sala de aula em projetos de letramento interdisciplinares”, orienta Maria Sílvia Martins.
A docente da UFSCar tem realizado um trabalho junto a escolas para divulgar e implantar o jogo: “Venho me propondo a conversar e orientar professores de Educação Infantil e de Ensino Fundamental I que, após lerem o tutorial, se interessem de fato na implementação do jogo com seus alunos”.
Dúvidas podem ser esclarecidas pelo e-mail: grupo.leetra@gmail.com.
Sobre o povo indígena bororo
Segundo Maria Sílvia Martins, que pesquisa a cultura e a língua de povos indígenas no Brasil, os bororos detêm, hoje em dia, seis Terras Indígenas (TIs) demarcadas no estado do Mato Grosso, num território descontínuo que corresponde a uma área 300 vezes menor do que o seu território tradicional, que antes atingia a Bolívia, parte do estado de Goiás e do Mato Grosso do Sul.
Na década de 1970, o alto grau de insatisfação dos bororo fez surgir um movimento pela recuperação de suas terras tradicionais e pela melhoria dos serviços de saúde e educação. Houve, em 1976, a luta pela terra do Meruri, que culminou no famoso massacre levado a cabo pelos fazendeiros do general Carneiro. Atualmente, a Língua Bororo, que pertence ao tronco linguístico Macro-Jê, é falada por quase toda sua população.
Mais detalhes, imagens e informações sobre esse povo podem ser encontrados no site
Sobre o Leetra
O grupo Leetra/UFSCar, responsável pela iniciativa, conta com três linhas que se relacionam com a questão indígena: Línguas Indígenas; Letramento e comunicação intercultural; e Estudos de Tradução e Poética, que aborda a tradução de cantos e narrativas indígenas.
Representantes locais dos povos hunsriqueanos, pomeranos, talians, westfalianos e poloneses participaram do ato – Foto: Itamar Aguiar/Palácio Piratini
O governador Eduardo Leite sancionou, na tarde desta segunda-feira (21/2), no Palácio Piratini, o projeto de lei (PL) que reconhece as línguas e culturas locais como de relevante interesse cultural do Estado e institui o Dia Estadual da Língua Materna e das Línguas e Culturas Locais, que passará a ser celebrado anualmente em 21 de fevereiro. O PL 36/2020 é de autoria do deputado estadual Elton Weber.
“É muito importante essa valorização da nossa diversidade étnica, cultural e racial, porque é a partir dessa valorização que construímos uma sociedade com o entendimento de que as nossas diferenças não nos diminuem, mas potencializam o nosso desenvolvimento. Somos diversos, e isso nos enriquece e contribui para a construção de um mundo mais tolerante e com mais respeito. Por isso é uma alegria poder sancionar esse projeto que contribui para a valorização da diversidade e das diferentes culturas que formam nosso Rio Grande”, disse o governador.
A secretária da Cultura, Beatriz Araujo, que também participou do ato, destacou a importância da pluralidade linguística e cultural. É uma alegria ver uma iniciativa dessa natureza vindo da Assembleia Legislativa para valorizar a cultura local. Estamos trabalhando incessantemente pelo fortalecimento do nosso sistema estadual de cultura e pelo reconhecimento da diversidade cultural”, disse.
A diversidade linguística é um dos 12 segmentos com representatividade em colegiados setoriais organizados pela Secretaria da Cultura. Dentre as ações da secretaria estão o direcionamento de recursos do Pró-Cultura para atender às demandas do segmento e projetos contemplados pela Lei Aldir Blanc. A secretária também citou o exemplo do Projeto Cucagna Scola De Talian, que apoiou, no âmbito do Pró-Cultura, a criação de uma escola virtual para ensino a distância desse idioma.
O deputado Elton Weber, proponente da lei, falou sobre a escolha da data para o Dia Estadual da Língua Materna e das Línguas e Culturas Locais. “Hoje, 21 de fevereiro, é o Dia Mundial das Línguas, criado pela Unesco [Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura], e por isso achamos importante que fosse esse o dia que reconhece e valoriza a diversidade linguística e cultural do nosso Estado”, explicou.
Também participaram do ato de sanção os representantes locais dos povos hunsriqueanos, pomeranos, talians, westfalianos e poloneses.
Projeto de lei de cooficialização das línguas indígenas chegará ao plenário da Câmara dos Deputados com pedido de regime de urgência
m São Gabriel da Cachoeira, no Alto Rio Negro, no Amazonas, fala-se tukano, baniwa, nheengatu… e português. Duas décadas depois do primeiro município brasileiro ter línguas indígenas cooficializadas, o que abriu espaço para outras cidades com forte presença de populações indígenas replicarem a lei no país, apenas oito línguas indígenas já foram cooficializadas em sete municípios do Brasil – de um total calculado em 180 línguas indígenas faladas por etnias do país. A última a entrar na lista foi a língua mebêngôkre, falada em São Felix do Xingu, no Pará: cooficialização ocorreu em 2019.
Com o estatuto de língua cooficial em relação à Língua Portuguesa, os povos indígenas garantem o ensino da língua nos seus município, assim como documentos oficiais e todos os tipos de sinalizações e orientações em repartições públicas. A cooficialidade é um reconhecimento que o Brasil é país um plurilinguístico. Apenas 10 municípios têm línguas indígenas cooficializadas: além de São Gabriel (AM), onde o ianomani também foi oficializado, e São Félix (PA), Bonfim e Cantá, em Roraima, oficializaram macuxi e wachipana; Tocantínia (TO) reconhece xerente; em Tacuru, no Mato Grosso do Sul, o guarani é língua oficial; Barra do Corda, no Maranhão, reconheceu tenehara/guajajara; em Santo Antônio do Içá, no Amazona, o tikuna tornou-se língua cooficial; o terena é reconhecido em Miranda (MS); no município cearense de Monselhor Tabosa, o tupi-nheengatu é língua cooficial ao lado do português.
Na Câmara dos Deputados, depois de aprovado nas comissões de Cultura e de Direitos Humanos e Minorias, o projeto de lei 3074/19, do deputado Federal Dagoberto Nogueira (PDT/ MS), segue para a Comissão de Constituição de Justiça, presidido pela deputada bolsonarista Bia Kicis (PSL/DF); o projeto estabelece que, em todos os municípios com comunidades indígenas, a língua da etnia deve ser cooficial. “A cooficialização das línguas indígenas nos municípios que possuem comunidades indígenas significa dar visibilidade e, consequentemente, a garantia de direitos aos seus falantes”, defende o parlamentar.
Escola indígena no município de Tacuru, em Mato Grosso do Sul: guarani como língua cooficial (Foto: Prefeitura de Tacuru)
Por ter sido aprovado por unanimidade nas duas comissões, Nogueira acredita que não terá dificuldades de ver seu projeto de lei passar na Comissão de Constituição de Justiça. “Espero que também seja aprovado por unanimidade”, avalia o parlamentar, antecipando que, ao chegar no plenário, ele pretende encaminhar um pedido de urgência ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL). “Esse projeto de lei não é político e nem ideológico. Não acredito que venha sofrer resistência nem mesmo dos mais conservadores”, argumenta, lembrando que o primeiro deputado indígena eleito no país, Mario Juruna, chegou à Câmara dos Deputados pelo PDT.
Pesquisadores do Brasil e do exterior estão produzindo um dicionário para preservar a língua; estima-se que a cada 25 crianças que nascem na localidade, uma nasce com surdez
Várzea Queimada, distrito de Jaicós, no sertão do Piauí, distante cerca de 370 km de Teresina, possui 900 moradores e tem um dos piores índices de desenvolvimento humano do país, ficando na posição 5.430°. Mas a comunidade também chama a atenção por um outro motivo: a quantidade de pessoas surdas que nascem lá. Até agora, são 34. E, para se comunicar, eles desenvolveram uma língua própria: a Cena.
Agora, pesquisadores do Brasil e do exterior estão organizando um dicionário para preservar essa língua. É que tanto os surdos quanto os não surdos se comunicam através de gestos, que indicam ações do dia a dia, como ir à igreja ou avisar que está fazendo calor.
A localidade possui aproximadamente 34 pessoas surdas. (Foto: Reprodução/ TV Globo/Fantástico)
A diferença é que todos esses sinais foram criados por eles.Não por acaso, essa nova língua foi batizada de Cena.
Silvana Lusia Barbosa tem seis filhos. Três deles nasceram surdos. Como não tiveram acesso ao aprendizado de Libras, a Língua Brasileira de Sinais, o jeito foi improvisar.
“Foi difícil, mas consegui (educá-los), porque é uma regra que eles vão aprendendo, aprendendo até adaptar. Ainda hoje tem dificuldade, claro, porque os ouvintes também têm… mas deu para entender, eles já sabem comunicar todas as Cenas”, conta a dona de casa.
Silvana Barbosa ajudou a desenvolver a Cena em Jaicós. (Foto: Reprodução/ TV Globo/Fantástico)
Sem saber, a família ajudou a estruturar o que os pesquisadores chamam de língua emergente. O fenômeno despertou o interesse de um doutor em linguística pelo Massachusetts Institute of Technology.
“Acho até um nome bonito, que dá essa dimensão teatral. É uma língua nova, completamente inédita e completamente diferente de Libras”, explica Andrew Nevins.
Há cinco anos, especialistas da área de linguística da Universidade Federal do Delta do Parnaíba pesquisam as origens e o desenvolvimento da língua de sinais no povoado. De lá pra cá, os estudos avançaram bastante e até agora os pesquisadores já catalogaram quase 300 expressões utilizadas pela comunidade de surdos de Várzea Queimada.
O resultado está ganhando forma com o dicionário Cena/Libras. As palavras estão sendo registradas em fotos.
Dicionário comparativo de Libras e Cena está sendo organizado por pesquisadores. (Foto: Reprodução/ TV Globo/Fantástico)
Mas o que explica tantos surdos nascerem num só lugar? A resposta está na genética. A doutora Karina Mandelbaun estudou profundamente a localidade, onde o casamento entre primos era bem comum.
“A perda de audição é muito heterogênea, mas a forma mais comum é a herança recessiva. É o seguinte: nosso material genético está sempre aos pares. Por quê? Porque vem uma cópia do nosso pai e uma cópia da nossa mãe. E esse material genético contém ‘instruções’ para fazer todo o nosso corpo, desde a cor do nosso cabelo, da nossa altura, e também ele tem esses ‘defeitinhos’ que podem levar a alguma doença”, explica.
O município do Piauí é um dos únicos locais do mundo a participarem do estudo sobre evolução paralela da língua. (Foto: Reprodução/ TV Globo/Fantástico)
Os pesquisadores também querem traçar uma comparação entre o caso brasileiro, e outras duas comunidades que ficam na Turquia e outra em Israel, para analisar se há uma evolução paralela de linguagem.
A cultura indígena vem sendo, gradualmente, perdida no Brasil e um dos fatores de maior relevância nesse processo é a extinção de línguas indígenas. Um idioma vai muito além de um conjunto de palavras usadas para nomear sentimentos e objetos. Através da língua, um povo se expressa e mantém vivo o que existe à sua volta.
Ao longo desse artigo iremos explicar como essa extinção vem acontecendo. Vamos começar?
Extinção das línguas indígenas: por que está acontecendo?
Através do idioma, as sociedades transmitem seus conhecimentos de diferentes áreas e perspectivas em relação ao mundo. Um idioma é muito mais amplo do que apenas um conjunto de palavras.
As línguas trazem à tona tudo aquilo que um povo tem a oferecer. Dessa forma, podemos comparar o desaparecimento de uma língua com a destruição de um museu repleto de relíquias históricas.
Um indivíduo com o mínimo de conhecimento sobre a importância das relíquias históricas do museu ficaria bastante abalado com essa destruição. O Brasil tem assistido há anos uma destruição equivalente a essa do exemplo.
Cada vez mais línguas indígenas desparecem, deixando um vazio irreparável do ponto de vista cultural. Esse fenômeno de apagamento da cultura indígena não é recente. Diversos fatores contribuíram para esse processo no decorrer da história do nosso país.
Como teve início o processo de extinção das línguas indígenas no Brasil?
A extinção das línguas indígenas foi uma importante ferramenta utilizada pela Coroa Portuguesa para subjugar os povos que já viviam no território “recém-descoberto”, o Brasil. Os idiomas falados pelos indígenas foram sendo substituídos pela língua portuguesa.
Em meados do século XVIII, o português passou a ter status de língua oficial do país. Havia a proibição de que se falasse qualquer outro idioma que não ele. No entanto, mesmo assim, o tupi ainda era bastante falado nas ruas, inclusive pelos jesuítas.
Falta de preservação
Se na Era Colonial, houve um intenso trabalho de acabar com as línguas indígenas. Em tempos mais atuais não houve muito esforço no sentido de preservação desses idiomas. Para se ter uma ideia, foi apenas em 1988, ano da promulgação da nova Constituição Brasileira, que se observou algum esforço para valorizar e proteger as línguas nativas.
Porém, entre a Era Colonial e o começo desse esforço de proteção, houve um longo período de desatenção que gerou danos irreparáveis. Estima-se que eram faladas no Brasil entre 1.100 e 1.500 línguas. Desse amplo universo, conseguiram sobreviver apenas 190. Em 2016, identificou-se que 12 dessas línguas estavam extintas.
Em alguns casos, a língua é falada por menos de cem pessoas ou está apenas na memória de um grupo restrito entre dois e cinco indivíduos. Normalmente, esse grupo é formado por anciãos ou ouvintes não dotados de didática para transmitir a outras pessoas seu conhecimento.
Território e extinção das línguas indígenas
É importante assinalar que um dos fatores de maior peso no desaparecimento das línguas indígenas é a falta de rigor na preservação das terras destinadas a esses povos. Quando um povo não tem um território próprio e nem sua segurança garantida, não tem o mínimo necessário para manter viva a sua cultura.
A responsabilidade de garantir os direitos dos povos indígenas, sobre as terras tradicionalmente ocupadas por eles, é da União de acordo com a Constituição de 1988.
A Constituição Brasileira reconhece a organização social, costumes, tradições, idiomas e crenças indígenas. No entanto, alguns projetos de lei visam reduzir significativamente os territórios dos indígenas ou ainda permitir que os mesmos sejam explorados. Esses projetos se mostram totalmente contrários à necessidade de preservação da cultura e dos idiomas indígenas.
Qual é o papel da educação nesse processo?
Há diversas populações indígenas diferentes entre si e entre elas há algumas monolíngues, multilíngues ou plurilíngues. É relativamente comum que a alfabetização em escolas indígenas seja bilíngue. Dessa forma, os estudantes precisariam, em teoria, falar português e a língua da sua comunidade.
Contudo, há falta de professores capacitados para esse padrão educacional bilíngue. Dessa forma, não é incomum que o ensino bilíngue se encerre nos primeiros anos da educação fundamental.
Para os estudantes indígenas que anseiam por boas oportunidades acadêmicas, acaba se tornando mais interessante dominar o português, o idioma falado por boa parte do país. Nesse tópico não podemos deixar de mencionar ainda o afastamento, cada vez maior, dos indígenas da sua cultura nativa. Esse é o outro fator que corrobora para o desaparecimento de diversas línguas indígenas.
Como preservar as línguas indígenas?
Para que uma língua “escape” da extinção, precisa ter um número considerável de falantes. Os povos indígenas, no Brasil, constituem minorias que estão sob algum tipo de ameaça. Há projetos com foco na documentação e ensino de línguas indígenas. Porém, a responsabilidade dessa preservação é do Estado.
É papel do Estado garantir a proteção e a valorização das comunidades indígenas, assim como a preservação das suas línguas maternas. O Estado precisa investir na valorização e criação de instrumentos eficientes para valorizar as línguas indígenas.
Esse é um tema de grande relevância para o futuro do Brasil, afinal se trata do apagamento de parte da cultura do país!