Gersem Baniwa destaca crescente presença indígena na UnB

 

Professor do Departamento de Antropologia da UnB, Gersem Baniwa ressalta a inserção indígena nas universidades como primordial para pluralidade epistêmica e científica. Foto: Anastácia Vaz/Secom UnB

Nascido na aldeia Carará-Poço, no distrito de Assunção do Içana, parte do município de São Gabriel da Cachoeira, Gersem José dos Santos Luciano – que também se autodenomina Gersem Baniwa – foi alfabetizado em português aos 12 anos. Antes, falava somente sua língua materna, o nheengatu.

“A vontade de estudar superou todos os obstáculos e sacrifícios encontrados e enfrentados ao longo do caminho da formação escolar e universitária”, diz o indígena do povo Baniwa, hoje doutor em Antropologia Social pela Universidade de Brasília e professor do Departamento de Antropologia da UnB.

Na entrevista a seguir, Gersem Baniwa fala um pouco sobre a crescente presença indígena na UnB e também sobre a influência acadêmica e política da vida e obra de Darcy Ribeiro. A entrevista completa será publicada na 37ª edição da Participação, a revista de Extensão da UnB.

 

Nos últimos anos, a presença indígena na UnB aumentou – hoje são 229 estudantes de graduação e 33 de pós-graduação, além dos docentes. Enxerga essa mudança como um movimento de democratização da educação pública?
A presença indígena crescente na UnB e no ensino superior como um todo faz parte do movimento mais amplo pela democratização da educação pública e em especial da educação superior, assumida pela sociedade brasileira nos último anos, como resultado de vários fatores históricos favoráveis, tais como o avanço dos direitos humanos, o processo de redemocratização do país, os programas de enfrentamento do racismo e combate a desigualdade e injustiças históricas cometidas contra segmentos minoritários, como são os povos indígenas e a luta e pressão exercida pelo movimento indígena organizado e seu aliados.

Diante das necessidades de um mundo cada vez mais globalizado, os indígenas compreendem que a educação escolar e universitária pode ser um instrumento de fortalecimento de suas culturas e identidades e ainda um canal de acesso aos bens e valores materiais e imateriais do mundo moderno. O Brasil é um dos países com maior diversidade indígena nas Américas. Segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para 2020 são mais de 1 milhão de indígenas de 305 etnias, falantes de 275 línguas nativas. Desse total, 37,4% falam ao menos uma língua indígena. A ameaça de perda de línguas indígenas, assim como a extinção de povos indígenas, é uma realidade histórica ainda presente no Brasil e equivale à perda de elos na formação humana, pontos de vistas únicos e singulares sobre a vida, o mundo e o universo.

 

A promulgação da Lei nº 12.711/2012 – Lei de Cotas – é um marco na promoção da igualdade racial no Brasil, precedida por esforços e iniciativas pontuais. Dentre tais iniciativas, no caso do ingresso específico de indígenas na educação superior, destaca-se a experiência desenvolvida na UnB por meio do Vestibular Indígena, sendo este pioneiro entre seleções desta natureza no país. A presença indígena crescente na educação superior nos últimos 20 anos sinaliza, por si só, as possibilidades da pauta antirracista na universidade, até então não concebidos neste espaço enquanto uma política pública, deu maior visibilidade às situações de racismo, preconceito e exclusão sociocultural e étnica, linguística e epistêmica ao mesmo tempo, possibilitou indagar o sentido da universidade pública e da produção do conhecimento, afirmando e fortalecendo pedagogias antirracistas e inclusivas da diversidade e abrindo espaço para as línguas, ciências, ontologias, epistemologias, cosmovisões, metodologias, sistemas e regimes de conhecimentos tradicionais e ancestrais indígenas.

A UnB vem passando pela experiência de receber estudantes e docentes indígenas, até então tratados como outros, desconhecidos, distantes, exóticos e estranhos nos bancos acadêmicos. Os acadêmicos indígenas também têm assumido a responsabilidade de enfrentar e discutir a diversidade cultural, social e epistêmica, que se apresenta cada vez mais por meio da presença não somente de estudantes de diferentes pertencimentos étnicos, mas também de negros, campesinos, travestis, transexuais e de outros segmentos sociais oriundos de realidades culturais, sociais e econômicas distintas. A partir desta inserção, estudantes e docentes indígenas vivenciam as tentativas de diálogo com uma realidade cultural diferente da vivenciada em suas comunidades. À medida que o número de estudantes e docentes indígenas aumenta, as expectativas por resultados se intensificam, por parte de suas comunidades e da sociedade.

Assim, iniciamos a década de 2020 com boas notícias no tocante ao ingresso e permanência de indígenas na educação superior, mas também com a preocupação de dar continuidade às políticas públicas bem-sucedidas, uma vez que, em 2023, a Lei de Cotas deverá ser avaliada pelo parlamento brasileiro, e de decidir pela sua renovação ou não. A prorrogação da Lei de Cotas e a consolidação das políticas afirmativas para os povos indígenas são essenciais para a manutenção e ampliação da presença indígena na educação superior e para avançar no exercício efetivo de intercientificidade dentro da universidade, reconhecendo e promovendo os sujeitos diversos com suas culturas, saberes e epistemologias e abrindo novos diálogos entre as ciências acadêmicas eurocentradas e outras ciências de indígenas, de negros, de asiáticos e de outros povos. Assim, o desafio que se constitui é o de visibilizar afirmativamente a presença indígena na educação superior acompanhada da visibilidade e articulação das iniciativas e experiências institucionais de ações afirmativas na perspectiva de uma universidade mais inclusiva da diversidade, mais acolhedora e promotora de todos os saberes e seus sujeitos, enfim, uma universidade plural, intercientífica e interepistêmica. A presença de indígenas e outros sujeitos da diversidade na universidade nos anima e nos enche de esperanças por uma instituição educativa verdadeiramente universidade, que acolhe, agrega, soma, promove e expressa o universo ilimitado e plural de saberes, valores e sujeitos de conhecimentos. Sonhamos com uma universidade pluricultural, pluriétnica, plurirracial e pluriepistêmica. Universidade esta potencialmente capaz de contribuir para a derrubada definitiva do racismo e da violência epistêmica e para construir pontes, trilhas e horizontes civilizatórios que nos entrelaçam com as nossas diferenças e diversidades de experiências e existências. A UnB tem importante tarefa e responsabilidade social, política e acadêmica nessa perspectiva, por sua própria origem, história e contexto geopolítico nacional.

 

Agora falando sobre Darcy Ribeiro, ele dedicou boa parte da sua vida à questão indígena. Qual a relevância de sua obra hoje para os acadêmicos indígenas? 

Darcy Ribeiro foi um antropólogo, indigenista, intelectual, político e cidadão profundamente preocupado, sensível e comprometido com os problemas do país, dentre os quais os dos povos indígenas. Isso por si só deve ser inspiração e motivação para os acadêmicos indígenas e não indígenas. Além disso, as obras de Darcy Ribeiro são referências para a compreensão das realidades, dos desafios, dilemas e possibilidades reais e potenciais dos povos indígenas contemporâneos. Suas obras são as que melhor expressam os pensamentos dominantes sobre os povos indígenas no seu tempo. Portanto, conhecer e compreender suas obras e seus pensamentos e ideários é fundamental para situar a questão indígena na sociedade brasileira como um todo, envolvendo, academia e estado. Darcy Ribeiro foi responsável por garantir maior visibilidade às questões e realidades de profunda violência, extermínio, desigualdade e submissão que vitimavam os povos indígenas e foi comprometido e engajado na busca por soluções e por algum futuro, ainda que fosse parcial, aos povos indígenas. Com isso, acabou lançando importante luz sobre as questões e realidades dramáticas vividas pelos indígenas em fase avançada de extermínio e extinção. Essa visibilidade dada aos dramas e dilemas indígenas de sua época contribuiu muito para a importante mudança no curso da história dos povos indígenas nos anos seguintes, de uma população condenada ao desaparecimento a uma população reemergente demográfica e culturalmente crescente, além da crescente conquista de cidadania e protagonismo político.

 

Darcy trouxe visibilidade para a questão indígena tanto no campo acadêmico quanto no político. Como ele contribuiu para a questão das demarcações de Terras Indígenas? 

Darcy Ribeiro tem muitas e importantes contribuições aos povos indígenas, dentre as quais, no campo de conquistas territoriais, principalmente na Amazônia. As obras de Darcy Ribeiro contribuíram muito para que os conceitos de terras indígenas passassem a ser pensadas como território, e não como pequenas glebas ou reservas, como era o pensamento e prática corrente até então, incorporando as noções de territórios tradicionais de usos, costumes e habitat de autóctones, incorporados na Constituição brasileira de 1988. Tais noções impactaram positivamente com novas bases conceituais, metodológicas e administrativas nos processos de demarcação de terras indígenas, responsáveis por tornar a Amazônia Legal em 22% de terras indígenas ou 98% em extensão de todas as terras indígenas do Brasil. Darcy Ribeiro tinha profunda preocupação com o processo de dizimação e submissão dos povos indígenas e por isso empenhou-se em colocar a questão indígena com a devida importância histórica, desde o início da formação do Estado e da nacionalidade brasileira até a importância destes no Brasil contemporâneo, como fundamento para a defesa do reconhecimento e da garantia dos territórios tradicionais indígenas.

FONTE: UnB 

Pesquisadores criam aplicativo para tradução da única língua viva descendente do Tupi

O aplicativo chamamdo Grammyep traduz textos em Nheengatu para português e inglês, e vice-versa
Nheengatu, também conhecida como Tupi-moderno, língua geral amazônica ou “língua boa” na tradução Tupi – Reprodução

Quando os portugueses invadiram o Brasil, por volta de 1500, notaram que o Tupi era a língua mais falada em toda a costa. Ao invés de ensinarem português para os habitantes locais, os relatos mostram que inicialmente eles resolveram aprender o Tupi e utilizar essa língua como uma língua geral.

Assista ao vídeo:

A partir daí, aquele Tupi que era usado nas aldeias passou a ser usado em comunidades e pequenas cidades, tornando-se a língua principal da colônia, utilizada também pelos portugueses e suas famílias. Então, o Tupi foi mudando e se transformou em várias línguas gerais. Os especialistas acreditam que havia três línguas gerais, no entanto duas se extinguiram por completo.

 

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Cátedra UNESCO em Políticas Linguísticas para o Multilinguismo é renovada por um novo quadriênio

UCLPM – UNESCO CHAIR LPMA Cátedra UNESCO em Políticas Linguísticas para o Multilinguismo (UCLPM) , da qual o IPOL é parceiro foi renovada para um segundo quadriênio de funcionamento (2022-6). Coordenada pelo Prof. Gilvan Müller de Oliveira, a Cátedra é a primeira com sede na UFSC, criada em maio de 2018 com a assinatura do contrato entre a UNESCO/Paris e a universidade.

Trata-se de uma rede internacional de pesquisa nos quatro continentes envolvendo 26 universidades de 16 países que pesquisam e ensinam em 11 diferentes línguas. A UCLPM trouxe para a UFSC até o momento 10 convênios internacionais em países como México, Colômbia, Chile, África do Sul, Indonésia, Índia, China (Macau), Rússia, França e Espanha. Novas instituições continuam pedindo filiação à Cátedra e ainda este ano terá o ingresso da Universidade Nacional de Antioquia, na Colômbia, e do Instituto de Estatística da Índia, de Calcutá.

A rede de pesquisa tem por objetivo produzir conhecimento acerca de diferentes contextos multilinguísticos, das políticas linguísticas implementadas nesses lugares e suas implicações para o desenvolvimento sustentável de cidadãos, comunidades, países e regiões. São promovidos eventos, publicações, mobilidade acadêmica, formação de estudantes de mestrado e doutorado, além de serviços de orientação para comunidades linguísticas e governos. A Cátedra conta com os vice-coordenadores Profa. Suzani Cassiani e Prof. Irlan von Linsingen e está ligada aos setores da UFSC CCE, SINTER, DLLV, DLLE, PGET, PPGLIN, entre outros.

Saiba mais sobre a Cátedra aqui.

Nova versão eletrônica do livro “Hunsrückisch: Inventário de uma Língua do Brasil”, confira!

A nova versão eletrônica do livro “Hunsrückisch: Inventário de uma Língua do
Brasil”, editada no ano de 2022, incorpora um encarte com imagens da pesquisa de
campo intitulado “Os personagens, os lugares e bastidores do dia a dia da pesquisa.
Encontros com a língua e a memória”. E ainda, retifica a lista de autores, com a
inclusão de Chari Gonzalez Nobre e Mariela Silveira.

 

 

 

 

 

 

 

 

ALTENHOFEN, Cléo V.; MORELLO, Rosângela; BERGMANN, Gerônimo L.; GODOI, Tamissa G.; HABEL, Jussara M.; KOHL, Sofia F.; NOBRE, Chari G.; PREDIGER, Angélica; SCHMITT, Gabriel; SEIFFERT, Ana Paula; SILVEIRA, Mariela F.; SOUZA, Luana C.; WINCKELMANN, Ana C. Hunsrückisch: inventário de uma língua do Brasil. Florianópolis: Garapuvu, 2022. 248 p.

Baixe o pdf do livro aqui.

 

 

III Seminário de Línguas Indígenas do Sul da Mata Atlântica

O III Seminário de Línguas Indígenas do Sul da Mata Atlântica, voltado à divulgação de políticas linguísticas envolvendo três línguas indígenas faladas no sul da Mata Atlântica, será realizado nos dias 20 e 21 de setembro, no auditório de Centro de Comunicação e Expressão (CCE). O evento é resultado de uma parceria entre estudantes indígenas, docentes do curso de Licenciatura Intercultural Indígena (LII) e o grupo de Políticas Linguísticas Críticas e Direitos Linguísticos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com apoio do Programa de Pós-Graduação em Linguística (PPGL).

A iniciativa agrega estudantes, professores e pesquisadores indígenas em torno da divulgação e defesa das línguas indígenas Guarani, Kaingang e Xokleng-Laklãnõ, faladas pelos povos indígenas que vivem na parte meridional do bioma Mata Atlântica: Guarani (Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul), Kaingáng (São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) e Xokleng (Santa Catarina). O evento busca valorizar o protagonismo de pesquisadores indígenas na promoção dos debates e reflexões, bem como na participação ativa na organização de atividades do evento.

> Clique AQUI para se inscrever

O Seminário celebra o Ano Internacional das Línguas Indígenas (International Year of Indigenous languages – IYIL2019), conforme definido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em atenção à cultura e à riqueza linguística desses povos.

Curso de Língua Tupi e História Cultural da Floresta

Curso de Língua Tupi e História Cultural da Floresta🌳🏹
online Via Zoom
*Serão oito encontros entre os meses de setembro a novembro de 2022.
Teremos duas opções de dia e horário:
Nas segundas feiras:
Das 17hs às 18h15.
Ou nas quartas feiras:
Das 17h45 às 19hs
O objetivo deste curso é, em primeiro lugar, trabalhar conexões da ancestralidade brasileira à milenar presença indígena manifesta na ancestralidade da cultura e proto-língua Tupi, de aproximadamente 5000 AP,  como uma das línguas originárias da Floresta Amazônica, também vivenciada na Floresta Atlântica, e que nestas florestas nomeiam plantas, animais e desvelam um modo de vida e visão de mundo que se constituiu milenarmente conjunta a uma ampla biodiversidade florestal.
A estrutura das línguas indígenas diferem das línguas da família latina/românica (do Tronco Indo-Europeu) representando uma visão de mundo muito diversa da transmitida pela língua em que fomos colonizados, o português.
O estudo das línguas indígenas pode nos possibilitar o resgate de uma memória da floresta a partir de uma perspectiva dos povos e culturas da floresta que está remanescente na ancestralidade do território que nomeamos de Brasil.
A nível linguístico iremos verificar desde as chaves de pronúncia à estrutura gramatical que possa nos possibilitar a tradução de textos e a fluência na compreensão da fala. Dentro de uma perspectiva multidisciplinar, a nível histórico, arqueológico, biogeográfico e sociocultural o estudo do Tupi pode também elucidar  a presença desta língua tanto na toponímia dos territórios  quanto no vocabulário do português falado no Brasil.
O curso engloba uma bibliografia básica que evidência a importância histórica e cultural das línguas indígenas como línguas ancestrais surgidas nas florestas (como as presentes aqui) e o estudo da descolonização do pensamento e imaginário nacional.
🌳🌳🌳🌳🌳
O curso terá 8 encontros de uma hora e quinze minutos semanal durante dois meses.
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Contato e inscrição solicitar por WhatsApp 📞:
(11) 934629664
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