MPF recomenda que Secretaria de Segurança da PB permita que indígenas tenham nome de etnia em carteira de identidade
Órgão alega que medida é constitucional e assegura concretização de direitos referentes à cultura e identidade dos povos
Indígenas Tabajara. Crédito da foto: Ascom MPF/PB
O Ministério Público Federal (MPF) expediu recomendação à Secretaria de Estado da Segurança e Defesa Social da Paraíba, para que insira informação referente ao pertencimento étnico do indígena, que assim o desejar, no campo “observação” do documento oficial de identificação (RG). Para o MPF, tal medida, além de não encontrar impedimento legal, assegura ao indígena a concretização de direitos referentes à cultura e identidade, a partir da certificação de sua identidade étnica, de modo a reconhecer sua organização social, língua, crença, tradições e costumes.
O procurador Renan Paes Felix justificou na recomendação que a informação referente ao pertencimento étnico do indígena também “é importante para que o Estado tenha em mão o quantitativo de indígenas de cada etnia, de maneira a otimizar a adoção de políticas públicas específicas e de proteção das comunidades indígenas locais”. O membro do MPF ressaltou que “a medida não encontra vedação no ordenamento jurídico, e prestigia aspirações constitucionais, supralegais e legais, o que torna indispensável sua implementação”.
No documento, o procurador da República cita que compete ao Ministério Público Federal a responsabilidade de defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas. Lembra, também, que a Constituição Federal reconhece aos indígenas sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições. Pontua, ainda, que a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas estabelece que todos têm o direito coletivo e individual de manter e desenvolver suas características e identidades étnicas e culturais distintas, incluindo o direito à autoidentificação.
A recomendação foi expedida a partir de representação do Coletivo Indígena Colmeia. O MPF fixou prazo de 15 dias para que o Estado da Paraíba informe se acata a recomendação e relate as ações e cronograma previstos para seu cumprimento. Ou, por outro lado, apresente justificativa que explique, fundamentadamente, os motivos pelos quais entende não ser possível o cumprimento da medida recomendada.
Procedimento nº 1.24.000.001282/2022-99
Estudante e jornalista da Unicamp lançam livro na Índia
A estudante do curso de Estudos Literários da Unicamp Daniela (Yepá) Villegas Barbosa e a jornalista Juliana Sangion, que atua na Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp (Comvest), lançaram, na Índia, o livro intitulado “Still I Rise”, em parceria com outros 30 autores indígenas de diferentes etnias e regiões da Índia. As autoras foram convidadas a integrar a publicação, com um capítulo a respeito da atuação de mulheres que são lideranças indígenas no Brasil, especialmente nas questões de território e da Amazônia, denominado “The Rise of the Amazons”.
Daniela conta que o convite foi feito há alguns meses, depois que as duas participaram de um encontro de povos originários da Índia e de outras partes do mundo, em 2019, denominado Samvaad, que aconteceu na cidade de Jamshedpur. Na ocasião, uma equipe da Unicamp, formada por Daniela, pelo estudante indígena Wallace Krenak e pela jornalista Juliana Sangion, levou ao evento um relato sobre a iniciativa do Vestibular Indígena Unicamp. Daniela e Wallace são da primeira turma de estudantes a ingressarem na universidade por essa modalidade. Juliana, além de atuar na comunicação do vestibular, participou da aplicação da sua primeira edição, na cidade de São Gabriel da Cachoeira (AM), e dirigiu o documentário “Purãga Pesika – Um encontro de boas-vindas”, sobre os primeiros estudantes indígenas a entrarem nos cursos de graduação da Unicamp.

Desde então, o Vestibular Indígena da Unicamp se consolidou como forma de ingresso, tendo passado de 611 candidatos na primeira edição para mais de três mil estudantes inscritos em 2023. No total, cerca de 400 estudantes indígenas de diferentes etnias entraram na Unicamp, em diferentes cursos, nos últimos quatro anos. Desde a edição de 2022, a Unicamp firmou uma parceria com a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), unificando o vestibular indígena entre as duas instituições.
A estudante e autora Daniela ressaltou a importância de escrever e falar sobre a representatividade de mulheres indígenas, que vem crescendo no Brasil nos últimos anos. “O livro foi uma oportunidade de abordar a diversidade de atuações dessas mulheres indígenas em seus papeis sociais, desde a atuação na comunidade até o ativismo em nível nacional. E tudo isso sem esquecer suas raízes: a ancestralidade, a questão da territorialidade, sua cultura. Toda vez que a mulher indígena estiver ocupando um espaço, ela leva consigo toda sua ancestralidade”, disse.
No capítulo “The Rise of the Amazons”, as autoras abordaram a trajetória de seis mulheres indígenas brasileiras e seu recente papel de relevância no cenário sociopolítico nacional: Sônia Guajajara, Célia Xakriabá, Elizângela Baré, Vanda Witoto, Txai Suruí e Joênia Wapichana. As duas primeiras, inclusive, foram recém-eleitas deputadas, em um feito histórico. Elas compõem a chamada “Bancada do Cocar”, um coletivo de representantes indígenas no legislativo.
Juliana Sangion, que foi à Índia para o lançamento a convite da organização do evento Samvaad, explica que o livro é um projeto em que jovens líderes indígenas, com papel relevante em suas comunidades, relatam suas experiências de impacto para o empoderamento de povos originários. É também um painel de vozes indígenas e não indígenas comprometidas com projetos e movimentos de rupturas positivas. “Foi uma experiência muito enriquecedora trocar informações e ideias com jovens indígenas de um país tão distante do nosso, mas com anseios e potenciais tão parecidos. Falar da iniciativa do Vestibular Unicamp na Índia foi gratificante, na medida em que percebia o interesse e a motivação deles”, disse Juliana.
Segundo Sourav Roy, chefe de responsabilidade social da Fundação Tata Steel, “O livro é nosso esforço para organizar e manter uma coleção de perspectivas e aprendizados de comunidades indígenas para o país e para o mundo em geral, reunida por indivíduos de todo o mundo apaixonados pela identidade tribal. Muitos jovens homens e mulheres que são uma parte essencial do ecossistema Samvaad certamente se inspirarão nesses aprendizados e os integrarão em seus trabalhos e suas vidas, levando-os adiante dentro de suas próprias comunidades”, afirmou.

Samvaad
O Samvaad é principal programa sobre identidade tribal da Fundação “Tata Steel”. É organizado anualmente na cidade de Jamshedpur, sudeste da Índia. Entre os dias 15 e 19 de novembro de 2022, reuniu cerca de 2.500 pessoas de mais de 100 etnias da Índia e de outros países. A partir do tema ‘Reimaginar’, a proposta foi discutir e imaginar o lugar legítimo das comunidades tribais no processo e nos resultados da reimaginação para todo o planeta.
O livro será aberto em uma plataforma digital e traduzido, no próximo ano, para vários idiomas indígenas da Índia e para algumas línguas indígenas brasileiras.
FONTE: Jornal da UNICAMP
II Seminário Internacional Viva Língua Viva é sediado na UFPA com participação de 29 etnias indígenas

Alexandre de Moraes – Ascom UFPA
O II Seminário Internacional Viva Língua Viva ocorreu na Universidade Federal do Pará (UFPA), de 22 a 25 de novembro, em parceria com o Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) e a Associação Brasileira de Linguística (Abralin). O evento teve como tema “Revitalização de Línguas: Por que e como fazer?” e também aludiu à Década Internacional das Línguas Indígenas (IDIL 2022-2023), proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, com o objetivo de chamar a atenção mundial sobre a situação crítica de muitas línguas indígenas e mobilizar recursos para a sua preservação, revitalização e divulgação.

Alexandre de Moraes – Ascom UFPA
A abertura do seminário teve a participação do reitor da UFPA, Emmanuel Zagury Tourinho; do prefeito de Belém em exercício, Edilson Moura; da presidente da Abralin, Adelaide Silva; da diretora do Instituto de Letras e Comunicação (ILC) da UFPA, professora Tânia Sarmento-Pantoja; do linguista e diretor da área de Ciências Humanas do MPEG, Hein van der Voort; da diretora da área de Linguística e Literatura da Capes e diretora de pesquisa da UFPA, professora Germana Sales; da coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGL) da UFPA, professora Ivânia Neves; e da presidente da comissão organizadora do evento, professora Ana Vilaci Galúcio.
Também participaram da abertura a pró-reitora de Ensino de Graduação da UFPA, professora da área de Linguística Marília Ferreira; a diretora geral da Secretaria Municipal de Educação (Semec), professora Araceli Lemos; bem como a ouvidora do município de Belém e doutoranda da UFPA Márcia Kambeba, que realizou um canto de saudação inicial, em língua indígena, para celebrar o encontro com os parentes.

Alexandre de Moraes – Ascom UFPA
Na sequência, a mestranda Veraneize dos Anjos, da etnia Arapium, representando os indígenas da região do Baixo Tapajós, abordou o tema “Por que e como fazer a preservação da língua Nhengatu”, conhecida como língua geral amazônica ou tupi moderno, pertencente à família tupi-guarani, sendo então derivada do tronco tupi.
O evento teve a participação de indígenas representantes de 29 etnias de todo o Brasil, entre as quais, os Terena, Kaingang, Apalai, Baniwa, Tembé, Rikbaktsa, Manoki, Galibi, Kali’na, Apurinã, Macuxi, Tapirapé, Galibi-Marworno, Ãwa Ikpeng, Kokama, Karajá, Xakriabá, Puroborá, Kadiweu, Puri, Karipuna, Sakuarabiat, Awa, Guajá, Mÿky. Entre estudantes de graduação, pós-graduação e também docentes em Instituições de Ensino Superior, os indígenas participaram como público, oficineiros(as) e ministrantes do seminário.

Alexandre de Moraes – Ascom UFPA
Celebração – A coordenadora do evento, Ana Vilaci Galúcio, iniciou os pronunciamentos de abertura do evento afirmando que a razão de ser do seminário, em sua segunda edição, é justamente a celebração da língua dos povos originários. Ela recordou que o primeiro seminário foi realizado no Rio de Janeiro, em 2019, e destacou o quão é importante que, desta vez, o evento esteja sendo sediado na Amazônia, em Belém. “Estamos aqui para aprender e trocar experiências sobre a revitalização das línguas indígenas, somando esforços à década em que refletimos, no mundo, sobre o tema ‘Nada para nós sem nós’. Que possamos estar na linha de frente para reverter silenciamentos”, afirmou.
A professora Ivânia Neves, representando o PPGL UFPA, pontuou que a realização de um evento como o Viva a Língua Viva era inimaginável há alguns anos e que o seminário vem ressaltar a importância da universidade pública para o resgate da história e do protagonismo indígena no país. Para ela, o fato de hoje existirem alunos e professores indígenas em uma universidade é, por si só, uma revolução e, ao mesmo tempo, uma dívida. “Antes da colonização, Belém era território Tupinambá, terra de Maíra, do povo Maíri, do rio Guamá”, lembrou.

Alexandre de Moraes – Ascom UFPA
A coordenadora da área de Linguística e Literatura da Capes, Germana Sales, abordou a mitificação dos povos indígenas na literatura mundial, sendo de extrema importância recuperar, sem nuances, o lugar que é a eles devido na história da colonização, tendo sido historicamente silenciados pela barbárie, a escravidão e o genocídio. Na mesma linha de pensamento, o linguista representante do Museu Goeldi, Hein van der Voort, lembrou que, como consequência disso, muitas línguas indígenas encontram-se em risco de extinção, o que significa que seus falantes, da mesma forma, permanecem ameaçados, sendo, portanto, importante resistir.

Alexandre de Moraes – Ascom UFPA
Resistência – A resistência foi o cerne da fala da diretora do ILC UFPA, Tânia Sarmento, para quem o evento é extremamente necessário para a reparação histórica do que têm passado os povos originários no Brasil, sendo a produção científica sobre suas línguas uma das formas de manter viva as suas culturas e identidades. A presidente da Abralin, Adelaide Silva, concordou em dizer que um dos fatores pelos quais a Associação apoia a realização do evento é o de devolver o protagonismo da pesquisa na área aos próprios povos e falantes das línguas indígenas.
O prefeito em exercício de Belém, Edilson Moura, afirmou que a preservação das línguas indígenas é muito importante para preservar a própria cultura que resulta na diversidade sociocultural amazônica, tendo sido a UFPA uma das instituições que vêm permanentemente se esforçando, ainda que em contexto nacional de muitas dificuldades e negacionismos, para manter a ciência em movimento.

Alexandre de Moraes – Ascom UFPA
Diversidade – Para o reitor Emmanuel Tourinho, essa tarefa somente é possível por meio de parcerias como a estabelecida com o MPEG e a Abralin para a realização do seminário. Atualmente, por intermédio da política de reserva de vagas, a UFPA possui ativos cerca de 500 estudantes indígenas, além de mais de três mil alunos(as) quilombolas, bem como ribeirinhos(as) e oriundos de comunidades extrativistas, além de migrantes como os da etnia Warao, venezuelanos, aprovados por meio de processos seletivos especiais.
“Temos somado esforços para acolher, na instituição, a diversidade dos povos da Amazônia, na expectativa de que, cada vez mais, a UFPA tenha a cara da nossa sociedade. Somente um ambiente intelectual diverso pode oferecer debates que levem a soluções para os grandes desafios da região amazônica. Ouvir os povos originários é fundamental para uma universidade comprometida com o futuro da Amazônia”, afirmou.
Programação – O II Seminário Internacional Viva Língua Viva seguiu até sexta, 25 de novembro, com atividades realizadas em diversos espaços do Campus UFPA – Guamá. O evento contou com conferências, mesas-redondas, rodas de conversa, oficinas, sessões de comunicações e sessões de pôster, programações culturais, entre outras. A programação completa está disponível no site do evento: https://viva.abralin.org/eventos/viva-lingua-viva-22/.
FONTE: Ascom UFPA
Conheça o 1° time indígena de futebol do Brasil
O time representa a etnia Kyikatejê que, na língua Timbira Oriental, significa “povo do rio acima”

Foto: Magno Barros/Oficial Gaviões Kyikatêjê
Neste especial Copa do Mundo, a Fundação Nacional do Índio (Funai) apresenta fatos e curiosidades sobre indígenas e etnias que apresentam relação com o futebol. Fundado na década de 1980 no estado do Pará, o Futebol Clube Gavião Kyikatêjê foi o primeiro time profissional de futebol registrado entre os indígenas.
O time representa a etnia Kyikatejê que, na língua Timbira Oriental, significa “povo do rio acima”. O clube fica localizado no município de Bom Jesus do Tocantins, a pouco mais de 450 quilômetros de Belém, capital do Pará. A iniciativa logo chamou atenção por sua principal característica: a raiz indígena, com destaque em ser o primeiro time de uma etnia tradicional a disputar a divisão principal de um campeonato profissional estadual no ano de 2014.
Seu ex-treinador, Zeca Gavião, além de ser presidente do time, tornou-se ainda o primeiro indígena a comandar um clube do país. Anteriormente, o grupo era formado totalmente por indígenas e, atualmente, é um time misto.
O Gavião Kyikatêjê chamou tanta atenção por sua diversidade cultural que, em 2017, a Federação Internacional de Futebol (Fifa), entidade máxima do futebol mundial, produziu um documentário sobre a história do clube indígena, como forma de homenagear os indígenas pela iniciativa. Clique aqui para assistir o vídeo da Fifa.
Em 2022, o clube disputa a Série B do Campeonato Estadual Paraense.
Lei que cria a “Semana Cultural dos Povos Indígenas” foi sancionada em Rondônia
Semana Cultural dos Povos Indígenas que abordará a realidade dos povos originários

Nesta semana foi sancionada pelo governo de Rondônia, a Lei n° 5.452/22 aprovada na Assembleia Legislativa do Estado – ALE/RO, que cria a Semana Cultural dos Povos Indígenas. A iniciativa regulamenta em seus oito artigos, a conscientização quanto à importância da cultura e a preservação da memória dos povos que originariamente habitam o Estado de Rondônia.
A diversidade de povos indígenas presentes em toda a região Norte do Brasil e em grande número no Estado de Rondônia tem levado as autoridades locais a potencializarem políticas para desenvolver este seguimento da sociedade brasileira. Em apontamentos de lideranças indígenas, os últimos quatro anos têm sido proveitosos em ações quanto aos cumprimentos de objetivos constitucionais, em especial, o Inciso IV do Artigo 3° – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
A legislação que cria a agenda de debates sobre a valorização do indígena, marca a entrada no Calendário Oficial do Estado de Rondônia das comemorações, que anualmente acontecerão entre os dias 18 a 21 de abril.
As mais de 54 etnias de Rondônia, segundo dados da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental – Sedam, que têm usufruto das terras da União dentro das divisas rondonienses, para desenvolverem atividades econômicas com sustentabilidade têm se beneficiado de políticas do órgão. Uma das articuladoras é a Coordenadoria de Povos Indígenas – Copin, que submete propostas e projetos que possam garantir a geração de renda de forma sustentável nos territórios indígenas.
A inferência que a Semana Cultural dos Povos Indígenas faz em sua Lei, referente à desconstrução destes povos, é para o professor e pesquisador Alécio Valois, coordenador de Patrimônio do Estado de Rondônia – Sejucel, a síntese da motivação pública de defesa deste seguimento de população. “Estes dias de eventos anuais serão uma oportunidade para os indígenas falarem sobre sua realidade, além disso, professores e pesquisadores de diversas etnias compartilharão suas experiências”, pontuou Alécio.
PROCESSO HISTÓRICO
A desconstrução da visão preconceituosa frente à temática indígena, segundo o coordenador da Sejucel, só pode ter êxito se houver uma um olhar de todos os cidadãos sobre a realidade. “Somente assim poderemos ter uma sociedade mais tolerante, mais solidária e mais fraternal ”, contribuiu Alécio Valois.
O coordenador explica, ainda, a face de interculturalidade dos eventos oficiais da semana, de modo que profissionais de diversas áreas de conhecimento, bem como história, direito, entre outros, podem pormenorizar a visão de quem tem raízes indígenas e desenvolve suas atividades junto à sociedade. “Este estímulo cria uma relação intercultural que incentiva não indígenas a visitarem reservas indígenas sem a visão do índio do ano de 2022, não do índio de 1.500”, reconheceu Valois.
IDENTIDADE
Em comparação aos pesos e medidas nos quais a sociedade brasileira acostumou-se, Alécio relacionou o preconceito, no qual os grupos de Movimentos dos Sem Terra – MST sofrem por invadirem propriedades privadas, porém não há o mesmo rigor quanto sociedade frente à defesa indigenista. “Parte de nossos ancestrais, não indígenas invadiram terras que já eram ocupadas, então somos sem terra também, mas a maioria da sociedade não se olha como tal”, salientou.
O representante e conselheiro titular do Setorial Indígena de Rondônia, Welington R. Cinta Larga, emocionou-se ao comemorar a quebra de paradigma que a nova Lei vem proporcionar. “É gratificante saber que vamos ter a oportunidade de mostrar nossa cultura, nossa arte e mostrar para indígenas e não indígenas que nós estamos aqui”, declarou. Para ele, se a legislação permanecer será um fortalecimento à origem e cultura do País.
A Constituição Federal de 1988 possui o Capítulo VIII, exclusivo com dois artigos que versam sobre a defesa dos índios e seu reconhecimento apresentando uma organização social, costumes, línguas, crenças e tradições. No Censo do IBGE de 2010, o Brasil possuía 817.963 índios, dos quais aproximadamente 62% vivem em áreas rurais.
FONTE:
Uso de cartazes sobre audiências de custódia traduzidos para línguas indígenas é tema de painel apresentado por juíza do TJAM na 1.ª Conferência Amazônica do Clima e do Meio Ambiente
Coordenadora das Audiências de Custódia, a juíza André Jane falou sobre a iniciativa, resultado de parceria que envolve o CNJ, o Escritório das Nações Unidas sobre Doenças e Crime, a Esmam, o TJAM e organizações indígenas.
A experiência do projeto de tradução de cartazes desenvolvido pela Escola Superior da Magistratura do Amazonas (Esmam), em parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) junto a povos indígenas, dentro do “Programa Fazendo Justiça”, foi compartilhada nesta sexta-feira (18/11) em um dos painéis do segundo e último dia da “1ª Conferência Amazônica do Clima e do Meio Ambiente”. O evento é organizado pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) e Esmam tendo como local o Salão Rio Solimões do Palácio Rio Negro.
A apresentação do projeto ocorreu dentro do Painel 1 – “Acesso intercultural à justiça aos povos da floresta: garantindo informação sobre Audiências de Custódia em línguas indígenas no Amazonas” -, com explanação realizada pela juíza de Direito da 5.ª Vara Criminal de Manaus e coordenadora da Coordenadoria das Audiências de Custódia do Tribunal de Justiça do Amazonas, magistrada Andrea Jane Silva de Medeiros.
A comunicação intercultural acontece através de cartazes com uma série de materiais informativos sobre audiências de custódia traduzidos para as respectivas línguas indígenas, baseado na cartilha divulgada em 2021 pelo CNJ para a qualificação das audiências, conforme informou Andrea Jane, que é graduada pela Ufam (1994) e pós-graduada em Direito Penal e Processo Penal pela mesma instituição de ensino superior, e em Direito Eleitoral pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
“Nós apresentamos hoje uma das ações resultantes da parceria entre o Tribunal de Justiça, a Escola da Magistratura do Amazonas e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no âmbito do ‘Programa Fazendo Justiça’, do CNJ. Trata-se de um projeto de tradução de cartazes sobre audiências de custódia para as línguas indígenas do Alto Solimões, na língua Tikuna, e Vale do Javari, para as línguas Kanamari, Matis e Marubo. O projeto-piloto foi realizado através do CNJ em abril deste ano, em São Gabriel da Cachoeira, no Alto Rio Negro, onde foi traduzido também para três línguas. E o Tribunal de Justiça entrou com apoio, diferentemente deste projeto agora, em que ele toma à frente e passa a institucionalizar essa prática”, explicou ela, frisando que, a partir do protagonismo indígena, o CNJ publicou a Resolução CNJ n.º 287/2019, que estabelece procedimentos voltados para a garantia dos Direitos Humanos do indígena que responde a processos criminais.
A partir do projeto-piloto em São Gabriel da Cachoeira, disse a juíza e coordenadora, o Tribunal do Amazonas, que figurava como apoio, passou através da Coordenadoria das Audiências de Custódia, e com a parceria com a Esmam, a institucionalizar a prática com a escolha da região do Alto Solimões e do Vale do Javari. “E a partir desse projeto de institucionalização da tradução dos cartazes para línguas indígenas, foram realizadas inúmeras reuniões e encontros in loco em Benjamin Constant, Tabatinga e Atalaia do Norte, que contaram com a participação do Grupo de Monitoramento Carcerário, com a presença do desembargador Elci Simões, da Coordenadoria das Audiências de Custódia do Amazonas, da Esmam e com as organizações indígenas e indigenistas daquela região. E dessas reuniões chegou-se à necessidade de tradução dos cartazes contendo as informações das audiências de custódia para as línguas indígenas do Alto Solimões. Foi uma escolha natural, mas os indígenas da região foram ouvidos”, informou a magistrada.
A magistrada frisou que, em 2022, o Conselho Nacional de Justiça publicou a Resolução n.º 254, que estabelece diretrizes e procedimentos para efetivar a garantia do direito ao acesso ao Judiciário da pessoa e dos povos indígenas. No âmbito do Tribunal de Justiça do Amazonas, com a importante parceria da Esmam, que encampou, na pessoa do desembargador João de Jesus Abdala Simões, esse projeto trata, em sua essência, da promoção e garantia desse direito. Um acesso intercultural. E a tradução de materiais descritos sobre Direito se configura esse passo inicial”, disse Andrea Jane.
De acordo com a coordenadora das Audiências de Custódia, a ação mostra mais uma vez que o Judiciário está antenado às necessidades das populações na inclusão desses povos.
O projeto de acesso intercultural à Justiça, do “Programa Fazendo Justiça”, conta com a atuação conjunta, além do TJAM, Esmam e CNJ, também do Escritório das Nações Unidas sobre Doenças e Crime (UNODC), União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), Projeto Agro Vida, Museu Magüta, Conselho Indigenista Missionário e Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn)..
Opiniões indígenas
Pertencente à etnia Kambeba, Melquíades Ventura Neto era um dos indígenas presentes na plateia da 1.ª Conferência Amazônica do Clima e do Meio Ambiente. Natural de uma aldeia do Município de São Paulo de Olivença, no Alto Solimões, ele destacou a iniciativa do CNJ e do Poder Judiciário do Amazonas para com seus parentes das etnias Matis, Kanamari, Marubo e Tikuna.
“A importância desse projeto para os meus outros parentes Marubo, Matis, Kanamari e Tikuna é que ele representa o fortalecimento para nós. Hoje estamos vendo, presencialmente, que há uma preocupação com a língua materna, com a nossa cultura e com os nossos costumes e modo de viver. É muito bom enxergar que a educação se avança em prol de nós, indígenas. Iniciativas como essas nos fazem sentir valorizados pelo Poder Judiciário. Nós sentimos muito felizes por estarem nos enxergando e valorizando a nossa língua materna, trazendo fortalecimento”, declarou.
Para a liderança indígena Marcivana Sateré Mawé, coordenadora da Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno (Copime), e natural de Maués (distante quilômetros de Manaus), no Baixo Amazonas, a explanação da juíza Andrea Jane sobre os cartazes relativos às audiências de custódia em línguas indígenas no Amazonas “é uma iniciativa muito significativa, uma vez que nesses territórios nos quais estão sendo desenvolvidas essas ações a maioria dos indígenas é falante somente da língua materna nas regiões de Atalaia do Norte, Alto Rio Negro”.
Segundo Marcivana, a ação possibilita que o indígena se faça entender diante daquilo que é questionado. “Então, nos facilita esse entendimento, o diálogo, embora em línguas diferentes. Com certeza é uma valorização para nós, uma vez que um dos grandes desafios que nós temos enquanto indígenas é justamente esse, da vitalização das nossas línguas maternas, e isso só pode ser feito de fato, se fortalecida, com iniciativas como essas, que possamos falar na nossa língua materna, porque é o português que predomina. Além da questão do Direito, também no fortalecimento cultural dos povos”, declarou ela.
Outros paineis
O painel com a juíza Andrea Jane Silva de Medeiros foi antecedido pela abertura do evento por parte do juiz de Direito e secretário-executivo da Enfam, Jorsenildo Dourado do Nascimento e pelos paineis dos palestrantes ministro Herman Benjamin (com a temática “Panorama da Jurisprudência Ambiental do STJ”); Tasso Alexandre Richetti Pires Cipriano (“Logística Reversa e Economia Circular: Desafios e Iniciativas a partir da Agenda 2030”); Tiago Fensterseifer (“O Regime de proteção climática na Constituição Federal de 1988”) e; palestrante Girolamo Domenico Treccani (“Transparência das informações agroambientais na promoção do desenvolvimento sustentável”).
No período da tarde, encerrando o evento, houve grupos de trabalho (GT) enfatizando o “Respeito à autodeterminação dos povos indígenas, comunidades tradicionais e extrativistas e a garantia ao direito à consulta prévia, livre e informada” e “Capacitação continuada e permanente dos agentes de Justiça para atualização e aperfeiçoamento funcional com uso de novas tecnologias e metodologias inovadoras”.