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Para o povo Krenak, justiça chega meio século depois

Em 13 de setembro, a juíza Anna Cristina Rocha Gonçalves condenou o Governo Federal, o governo do estado de Minas Gerais e a Fundação Nacional do Índio (Funai) pelos crimes cometidos contra o povo Krenak no sudeste de Minas Gerais durante a ditadura militar (1964 a 1985). Ela ordenou que o Governo Federal organize uma cerimônia de desculpas públicas com cobertura nacional.

“A justiça, embora lenta, está sendo feita”, disse o líder indígena Geovani Krenak, neto de Jacó Krenak, à Mongabay. “O espírito de nossos guerreiros assassinados, como meu avô, [agradece] essa decisão.”

Integrantes do povo Krenak protestam contra projeto de lei anti-indígena em Brasília este ano. Foto: Geovani Krenak.

Falar na língua Krenak, beber álcool, manter relações sexuais, ficar ocioso (“vadiagem”), desrespeitar o toque de recolher, deixar o local sem permissão prévia e resistir à ocupação de suas terras por fazendeiros eram atitudes proibidas pelos militares da época, de acordo com relatórios e depoimentos de testemunhas. Confinamento arbitrário, tortura e espancamento eram punições comuns. Muitos Krenaks morreram nos campos, embora os números exatos ainda sejam desconhecidos.

A decisão, tomada em 13 de setembro, também ordenou que a Funai conclua o processo de demarcação da Terra Indígena Sete Salões, além de uma série de medidas para reabilitar a língua e a cultura Krenak.

A Advocacia Geral da União (AGU), que representa o governo federal e a Funai no caso, confirmou que recebeu a decisão, mas recusou-se a comentar. “Qualquer eventual manifestação ocorrerá no âmbito do caso”, escreveu o gabinete da AGU à Mongabay em um e-mail. A Advocacia Geral do Estado de Minas Gerais não respondeu aos pedidos de comentário da reportagem.

Pelo menos 8.350 indígenas foram mortos durante a ditadura militar, e muitos mais perderam suas terras ou foram torturados, de acordo com o relatório da Comissão Nacional da Verdade de 2014.

Minas Gerais foi palco de algumas das medidas mais cruéis. Em 1969, o militar Manoel dos Santos Pinheiro criou os campos de concentração indígenas conhecidos como Reformatório Krenak e Fazenda Guarani, que abrigaram um total de 121 indivíduos de 17 etnias diferentes nos municípios de Resplendor e Carmésia, de acordo com dados de uma pesquisa acadêmica compilados pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), ligado à Igreja Católica.

Famílias Krenak na Fazenda Guarani no começo dos anos 70 depois de serem retiradas à força de suas terras. Foto: Ligia Simonian, 1987 / Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

Os indígenas considerados rebeldes pelo regime militar eram enviados sem julgamento a esses dois campos de concentração, de acordo com provas constantes de um processo apresentado pelo Ministério Público Federal em 2015. “Os indígenas não eram submetidos a julgamento. Eles não tinham direito de praticar sua cultura e rituais, nem mesmo de falar sua própria língua”, diz o promotor federal Edmundo Antônio Dias, um dos coautores do processo.

O regime militar também criou a Guarda Rural Indígena, um grupo de indígenas treinados por oficiais militares para punir e torturar outros indígenas, o que causou uma ruptura nos modos de auto-organização e resistência entre as comunidades indígenas, dizem os promotores. Durante a cerimônia de graduação da primeira turma da Guarda Rural Indígena, um homem preso pelas mãos e pés num cabo de madeira – método de tortura chamado pau-de-arara – foi apresentado aos oficiais, que foram capturados em filme pelo antropólogo Jesco Von Puttmaker em 1970.

Indígena é exibido no instrumento de tortura conhecido como pau-de-arara em Belo Horizonte em 1970, durante a cerimônia de graduação da primeira turma da Guarda Rural Indígena. Foto: Jesco von Puttkamer.

Num testemunho que fez parte do processo, Douglas Krenak, outro dos netos de Jacó Krenak, contou as violações que seu avô sofreu nas mãos do regime: “Ele chegou em casa e dois militares o aguardavam. Pediram que ele ajoelhasse e assoprasse, dizendo que estava embriagado. Ele então teve as mãos amarradas com uma corda presa à sela de um cavalo e foi arrastado pela aldeia até a prisão, onde foi detido.”

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