Políticas públicas podem preservar 230 idiomas no Brasil
Políticas públicas podem preservar 230 idiomas no Brasil
Aline de Melo Pires
A herança cultural de um povo é preservada por sua língua. No Brasil, o idioma oficial é a Língua Portuguesa, mas existem, além dela, mais 230 línguas faladas no País. Desse total, 200 são de tribos indígenas e 30 de descendentes de imigrantes. Parece muito? Estima-se que, quando os portugueses atracaram por aqui, esse número chegava perto de 1 mil.
A falta de políticas públicas para preservar os idiomas e a característica cultural das suas comunidades está entre os principais motivos que levam à extinção de uma língua. A afirmação é da professora Ana Elvira Gebara, do curso de Mestrado em Linguística da Universidade Cruzeiro do Sul, em São Paulo (SP). “As línguas estão muito ligadas à situação social e histórica em que as comunidades vivem. O que acontece com as línguas indígenas, por exemplo, é que, se você não tem uma política para essas comunidades, a língua morrer é um reflexo de como elas estão sendo tratadas dentro do País”, afirma.
Atualmente, alguns idiomas são dominados por comunidades pequenas, que envolvem poucos integrantes. É possível, portanto, que muitos sejam extintos no futuro. Segundo a professora, contudo, não se pode prever quantas línguas deixarão de existir, pois essa tendência depende do movimento da sociedade e do que seguirá importante, ou não, para ela. A língua, conforme Ana, é a possibilidade de interação que o ser humano tem. Se não há essa interação, se perde uma forma de olhar e entender o mundo.
Interação e otimismo
Apesar das estatísticas, há iniciativas em curso em prol da manutenção dos idiomas nas comunidades brasileiras. Um exemplo é um projeto do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Recentemente, o órgão reconheceu três idiomas falados no Brasil como Referências Culturais Brasileiras. As línguas Talian, Asurini do Trocará e Guarani Mbya foram as primeiras a serem reconhecidas e passaram a fazer parte do Inventário Nacional da Diversidade Linguística (INDL). Os representantes de suas comunidades foram homenageados durante o Seminário Ibero-americano de Diversidade Linguistica, em Foz do Iguaçu/PR, entre 17 e 20 de novembro.
O Talian é falado por uma parte dos imigrantes italianos nos Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. O idioma começou a ser adotado quando os italianos chegaram ao País, no fim do século 19. Existem cidades em que ele é a língua co-oficial, como em Serafina Corrêa/RS, e tem tanta relevância quanto a Língua Portuguesa.
O Asurini do Trocará ou do Tocantins é a língua dos indígenas que vivem às margens do Rio Tocantins, na cidade de Tucuruí (PA). A língua faz parte da família linguística Tupi-Guarani. Já o Guarani Mbya é uma variedade moderna da Língua Guarani, junto com o Nhandeva ou Ava Guarani e o Kaiowa. A região dos povos que falam Guaranu Mbya compreende a faixa litorânea que vai do Espírito Santo ao Rio Grande do Sul e ainda a fronteira entre Brasil, Bolívia, Paraguai e Argentina. Distribuídos por várias comunidades, os Guarani representam uma das maiores populações indígenas do País.
Mobilização das comunidades
O reconhecimento dessas três línguas como Referências Culturais Brasileiras foi um pedido das próprias comunidades ao Iphan e representam o começo do que pode ser um resgate cultural no País. “O Brasil não é um País de uma só língua – estão envolvidos muitos aspectos culturais que significam elementos de transmissão e não podem ser perdidos”, explica Giovana Ribeiro Pereira, representante do Departamento do Patrimônio Imaterial do Iphan.
Com o intuito de ser reconhecida e integrar o Inventário Nacional da Diversidade Linguística, uma língua precisa ser falada em território nacional há, no mínimo, três gerações. O objetivo do Inventário é associar a expressão linguística a sua comunidade de referência e valorizar a expressão como aspecto relevante do patrimônio cultural brasileiro. Para fazer o pedido, os representantes das comunidades devem encaminhar a solicitação ao Iphan. Esse pedido é analisado por uma comissão técnica formada por representantes dos ministérios da Cultura, Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação, Justiça e Planejamento.
Assim como o português, outros idiomas falados no Brasil estão em constante evolução. Mas manter a autonomia e as raízes também depende dos próprios representantes das comunidades. “Existe uma escola em Caraguatatuba que tem alunos índios. Quando é preciso mandar bilhete para os pais, eles são enviados para o chefe da tribo. Computador eles conhecem, mas chamam de ‘caixa do pensamento’, ou seja, estão integrados à influência externa, evoluem, mas mantêm sua essência”, conclui Ana.
Fonte: noticias.terra.com.br