As línguas na Europa: o que mudará com o “Brexit”?

O que faz falta à Europa é uma abordagem de política linguística que vá além da opção “por defeito” da simples submissão à hegemonia e ao domínio do inglês.

Em segundo lugar,  se o papel do inglês não for questionado, o Reino Unido (tal como os anglófonos de outros países) continuará a beneficiar de transferências sem compensação, uma vez que a utilização do inglês no seio da União Europeia (UE) exigirá sempre um investimento muito significativo para aprender esta língua. Tal confere aos falantes nativos, sem qualquer contrapartida, uma vantagem considerável em mercados lucrativos: professores e cursos de línguas, venda de material pedagógico, certificação, etc.

Em terceiro lugar – e sobretudo – o inglês domina em vários outros contextos para além das questões internas da União. Uma vez que a UE tem menos anglófonos nativos, o inglês deveria, no seio interior, ser menos injusto mas os desequilíbrios manter-se-iam fora da UE. A UE não é, nem será nunca, uma ilha distante do resto do mundo, ainda pós-Brexit apenas tenha 6% da população mundial. A globalização só acentua este contraste. Nos planos económico, político e científico, o que conta não é a UE mas o mundo. Mesmo na UE, áreas não relacionadas com o seu funcionamento institucional, como o turismo, a edição científica ou os negócios, manter-se-ão sob uma forte atracção do inglês. Assim sendo, em todo o mundo, os anglófonos continuarão a beneficiar das mesmas vantagens materiais, culturais e simbólicas.

Face ao exposto, ainda que o “Brexit” possa reduzir a injustiça linguística no âmbito das instituições europeias, em sentido estrito, não anulará as vantagens de que os países anglófonos beneficiam unilateralmente – se o uso dominante do inglês na UE não for posto em causa.

Para quem não se sente incomodado com as transferências materiais e simbólicas atrás referidas e para os defensores do uso do inglês como língua dominante na Europa, o “Brexit” não deve ser fonte de inquietude, pelo menos por questões de língua; a ordem linguística (se assim puder ser chamada) não será alterada. Para quem, pelo contrário, se preocupa com o reconhecimento desigual das línguas e com as transferências sem contrapartidas que a hegemonia de uma língua provoca, e quem defenda a multipolaridade no mundo, o “Brexit” também não será motivo de júbilo, pois a necessidade de defender activamente a diversidade linguística continuará a ser tão imperiosa como o era. Claro que o problema não é a língua inglesa ; o problema é uma hegemonia desprovida de justificação política. As inquietudes que se possam ter a este respeito seriam exactamente as mesmas se a língua dominante fosse o francês e houvesse um “Frexit”.

Os defensores do multilinguismo são, pois, favoráveis a uma dosagem de estratégias adaptadas a diferentes situações, combinando a protecção das línguas locais com a aprendizagem eficaz de línguas estrangeiras, o desenvolvimento de competências receptivas em línguas próximas, um uso optimizado da tradução e da interpretação, utilizações inovadoras das tecnologias da linguagem, e, enfim, um uso mais equilibrado não apenas de uma mas de várias lingue franche (entre as quais o inglês). Enfim, mais do que o ilusório impacto de um “Brexit”, nesta área o que faz falta à Europa é uma abordagem de política linguística que vá além da opção “por defeito” da simples submissão à hegemonia e ao domínio do inglês. Esta abordagem do multilinguismo só pode nascer de um debate aberto e democrático sobre o nosso futuro linguístico enquanto europeus.

Manuel Célio Conceição, Universidade do Algarve

Astrid von Busekist, Instituto de Estudos Políticos de Paris

Helder De Schutter, Universidade Católica de Lovaina

Rob Dunbar, Universidade de Edimburgo

François Grin, Universidade de Genebra

Peter A. Kraus, Universidade de Augsburgo                          

Bengt-Arne Wickström, Universidade Andrássy, Budapeste

 Os autores são coordenadores de equipas no consórcio europeu de investigação “Mobilidade e Inclusão na Europa numa Europa Multilingue” (MIME, www.mime-project.org). Os pontos de vista aqui apresentados são, no entanto, apenas seus.

Fonte: publico.pt

mime
MIME est un projet de recherche sur le multilinguisme en Europe. Il est financé par le 7ème Programme-cadre de recherche et de développement de la Commission européenne. En s’appuyant sur une démarche interdisciplinaire novatrice, le projet MIME fournira un ensemble coordonné de propositions de politique linguistique garantissant le meilleur équilibre entre la « mobilité » et « l’inclusion ». Son cadre analytique combine des concepts et méthodes diversifiés qui permettent l’intégration de ces propositions dans la pratique. Le projet MIME identifie, évalue et propose des mesures visant à gérer de façon optimale le compromis (« trade-off ») entre deux objectifs qui ne convergent pas nécessairement : d’un côté, la mobilité et, de l’autre, l’inclusion des citoyens dans une Europe multilingue. Plutôt que de prendre comme données les possibilités de compromis accessibles à un moment donné, nous considérons que l’éventail de ces possiblités peut être élargis, sur le plan symbolique aussi bien que matériel ou financier, grâce à des politiques publiques soigneusement définies ainsi qu’à un usage adroit des dynamiques propres à la société civile.
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