Pauta indígena é prioridade no Ministério da Cultura

Indígenas caminham para o Palácio do Planalto, que recebe comitiva de lideranças que entregaram carta exigindo cumprimento de compromisso de campanha da presidente Dilma em relação aos povos indígenas - Foto: Fábio Nascimento / MNI.

Indígenas caminham para o Palácio do Planalto, que recebe comitiva de lideranças que entregaram carta exigindo cumprimento de compromisso de campanha da presidente Dilma em relação aos povos indígenas – Foto: Fábio Nascimento / MNI.

Pauta indígena é prioridade no Ministério da Cultura

A questão indígena é uma pauta prioritária para o MinC, que tem definido uma série de ações em torno da questão com o intuito de estimular um debate, com a participação ativa do coletivo, e de criar políticas que atendam suas demandas. O Ministério quer que temas como meio ambiente, reconhecimento cultural, direito à produção cultural e de informação integrem a pauta.

Entre as ações de apoio, está o acordo de cooperação técnica, assinado entre a Secretaria da Cidadania e da Diversidade Cultural do Minc e a Secretaria de Inclusão Digital do Ministério das Comunicações, para instalação de 170 antenas GESAC em comunidades indígenas, quilombolas e rurais. O Ministério também realizará, em parceria com o SESC/SP, o Encontro Brasil Indígena e o II Seminário Nacional de Culturas Indígenas, previsto para agosto deste ano, com a presença de lideranças de todo o país em rodas de conversas, representações culturais e encontro preparatório para a Conferência Nacional da Política Indigenista.

Em 2014, o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico), entidade vinculada ao MinC, incluiu no Inventário Nacional de Diversidade Linguística (INDL) as línguas Asurini do Trocará e Guarani Mbya como Referência Cultural Brasileira. Esta política de reconhecimento pretende ser ampliada ao maior número possível de idiomas para proteger a diversidade linguística. Além disso, o Iphan já reconheceu seis expressões e saberes indígenas, entre eles a Arte Kusiwa, pintura corporal desta comunidade do Amapá, e a cachoeira do Iauretê, lugar sagrado dos povos indígenas dos rios Uaupés e Papuri, no Amazonas.

Outro programa do MinC, o Cultura Viva, que atua desde 2004 nas comunidades indígenas, deverá publicar edital para a criação de novos pontos e pontões de cultura indígenas ainda em 2015. Em dez anos, cerca de 120 comunidades, nas cinco regiões do país, foram beneficiadas por esse programa.

Sobre a importância dos Pontos, Daiara Tukano, do Ponto de Cultura Rádio Yandê, opina que eles são fundamentais para as comunidade, pois “garantem a comunicação dos produtores culturais, que são os principais defensores de nossa memória e também têm um papel educador”. Foi o programa que possibilitou o nascimento da rádio, dedicada exclusivamente à difusão da produção indígena, como a música, e criou um fluxo de expressão cultural que contribui para o reforço da identidade do seu povo. “Há uma grande valorização dos jovens e novas linguagens surgem misturando o tradicional com o novo, ou com outros estilos como o rap e o ska”, diz ela. A rádio produz peças sobre arte tradicional e contemporânea e se transformou em referência para comunidades indígenas de outras partes do mundo.

Acampada em Brasília durante a Mobilização Nacional Indígena, rezadora Guarani Kaiowa observa parlamentares discursando - Foto: Lunaé Parracho / MNI.

Acampada em Brasília durante a Mobilização Nacional Indígena, rezadora Guarani Kaiowa observa parlamentares discursando – Foto: Lunaé Parracho / MNI.

Questões indígenas
Nem tudo são flores na questão indígena. O Dia do Índio, comemorado ontem, dia 19 de abril, remete a temas como meio ambiente, cultura, memória e reconhecimento histórico, mas, também, a questões como o desrespeito e a discriminação. O Brasil possui a maior sociodiversidade do planeta. Segundo o censo do IBGE de 2010, existem 305 etnias e 274 línguas indígenas faladas, além do português, mas a inclusão e a participação ativa dessas comunidades na sociedade brasileira e na escolha de seus destinos ainda é restrita.

Para Daiara Tukano, a data tem dois significados opostos. Por um lado “é a mostra da negação da nossa história, pois nos relega um único dia, nós, que somos o povo ancestral e realmente autóctone do país”, mas por outro, diz ela, “nos dá a oportunidade de lembrar que existimos como cultura, que temos uma concepção do mundo muito diversa; nos permite falar da nossa relação com a natureza, da nossa espiritualidade, e principalmente de reforçar a ideia de que estamos em um processo histórico de violência e perda de identidade que precisa ser revertido”.

Longe do clima de festa, o líder indígena Eliseu Guarani Kaiowá, da aldeia Kurusu Ambá, diz que a grande preocupação hoje é paralisar a PEC 215, proposta de emenda que transfere para o Congresso Nacional o poder de demarcar terras indígenas e que abre a possibilidade de alterar demarcações já feitas. “Suspender a demarcação de nossos territórios vai trazer ainda mais matanças e violência à nossa comunidade”. A aldeia Kurusu Ambá está em Mato Grosso, um dos estados chaves para o agronegócio. Eliseu, assim como outros líderes indígenas, recebe constantes ameaças de morte, já denunciadas no Conselho de Direitos Humanos da ONU.

A questão territorial é primordial para a sobrevivência das tribos, e os Kaiowá têm sofrido especialmente com esse problema. Muitos deles vivem à beira das estradas. Douglas Rodrigues, médico sanitarista e professor da Universidade Federal de São Paulo (USP), trabalha há mais de 20 anos com comunidades indígenas. Segundo ele, o índice de mortalidade infantil de crianças menores de um ano entre os Kaiowá é de 40 em cada mil, sendo que a média no Brasil para o resto da população é de 15.

Para Rodrigues, a saúde retrata a marginalização indígena no cenário político atual e ilustra muito bem o processo de aculturação ao qual são empurradas as comunidades. “Há uma invisibilidade de dados sobre a saúde indígena, e estes tampouco refletem a diversidade cultural e seus costumes. A tuberculose, por exemplo, é para alguns índios um mal espiritual e o médico não pode passar por cima dessa crença, que está relacionada à cosmogonia, aos relacionamentos sociais e à estrutura cultural da comunidade”, argumenta.

A indiferença ao contexto cultural amplia o drama indígena, de acordo com Rodrigues. Ele cita que “90% da área da saúde atualmente é terceirizada. A alta rotatividade de profissionais impede a formação específica e a criação de vínculo”, diz. Para o médico, a questão da terra também precariza as condições de saúde desses povos.

“Os índios Xavante, por exemplo, têm contato relativamente recente com a população branca, de cerca de 50 anos, e isso teve um impacto terrível na dieta alimentar desse povo devido ao recorte de suas terras, que impossibilita manter grandes roças. Hoje eles consomem alimentos industrializados e a consequência é um alto índice de obesidade. É uma verdadeira epidemia que pode provocar diabete e, posteriormente, cegueira nos índios. A incidência dessas doenças é ainda mais alta que no resto da sociedade”, diz Rodrigues. Segundo ele, esse ciclo demonstra falta de equidade das políticas de Estado, que poderiam ser melhoradas com a inclusão ativa das comunidades na escolha dos caminhos a serem seguidos. “Para muitos, o isolamento é a única saída possível”, diz.

Isolamento
Para o indigenista especializado em povos isolados Antenor Vaz, o isolamento é uma tática de sobrevivência e preservação cultural cada vez mais difícil de ser mantida. Isso porque as terras são disputadas por madeireiros, mineradores e pela política de desenvolvimento nacional. Na opinião dele, o Brasil está retomando uma concepção colonialista em relação a essas comunidades: “elas voltaram a ser vistas como um problema para o desenvolvimento do país”, afirma.

O escritor e professor da etnia munduruku Daniel Munduruku diz que a diversidade cultural indígena é um ingrediente fundamental para o Brasil se perceber como povo. “Se o país realmente quer ser uma pátria educadora, não podemos ser homenageados por um dia e depois jogados para debaixo do tapete. O Dia do Índio é uma ficção criada pela história brasileira, que nunca incluiu a nossa concepção”, comenta enfatizando que a demarcação das terras é fundamental para que sejam reconhecidos como cidadãos.

Muitas lideranças têm se aproximado do MinC para articular em conjunto ações e políticas que atendam suas demandas de uma forma mais integral.

A Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom), por sua vez, assinou na segunda-feira (20), a homologação de três reservas indígenas na região norte do país, que totalizam 232.544 hectares. Na quarta-feira, dia 22, o Ministério do Planejamento deve publicar autorização para realização de concurso público para provimento de 220 cargos para agentes da Fundação Nacional do Índio (Funai).

Fonte: MinC

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