Macau: Cantonês, uma língua entre dois impérios
Cantonês, uma língua entre dois impérios
Macau, China (Lusa) – O domínio do português, primeiro, como língua de lei de Macau, e depois do mandarim, o idioma nacional da China, deixaram o cantonês numa posição indefinida: é a voz da população, mas não se sabe se algum dia será a oficial.
Hoje, e até 2049, são duas as línguas oficias de Macau, o Português e o Chinês. No entanto muitos questionam o que está em causa com o termo chinês. É aquele que abarca todas as línguas do país e, portanto, o cantonês, ou é antes o mandarim?
Em Hong Kong, a questão é polémica, e tem sido alvo de intenso debate político. Atualmente, a página oficial do Governo de Hong Kong lista o cantonês, o mandarim e o inglês como línguas oficiais, mas no início de 2014, a publicação de uma referência ao cantonês como “um dialeto não oficial” numa página dos serviços de educação gerou uma onda de indignação, obrigando à remoção da frase.
Em Macau, o gabinete do chefe do Executivo explica que o termo ‘chinês’ na Lei Básica refere-se apenas ao idioma escrito, não havendo uma especificação sobre a oralidade: “Não há uma interpretação. Tanto o mandarim como o cantonês são empregados largamente pelo Governo e pela população.”
Para Rui Rocha, académico e estudioso da história, língua e cultura da China, o cantonês não é assumido como língua oficial “por uma questão política”.
Já Brian Chan, linguista da Universidade de Macau, considera que, mesmo sem o dizer, o Governo dá a sua resposta ao comunicar exclusivamente em cantonês: “Não sei porque não querem tomar uma posição firme mas em todos os gabinetes oficiais fala-se cantonês. Acho que é justo dizer que é a língua oficial de facto”.
Rui Rocha lembra que a situação atual do cantonês tem uma raiz histórica, já que, apesar da sua enorme força popular, viveu sempre entre as duas potências que dominaram o território.
“Juntaram-se aqui dois imperialistas linguísticos, Portugal e a China”, comenta, lembrando o lema do movimento de reforma linguística da China, “Uma nação, um povo, uma língua”, que evidência como o país “não vê com bons olhos a proliferação de outras línguas”.
Numa tentativa de unificar a nação, o mandarim foi tornado língua nacional em 1913, apesar de não ser falada pela maioria. A escolha não foi consensual, com Sun Yat-sen, o primeiro Presidente chinês, a fazer campanha pelo cantonês, por considerar o mandarim “um idioma simplista e que a sua escolha seria um desprestígio para a China”, lembra Rui Rocha.
Por outro lado, Macau teve também de lidar com o português, uma língua que lhe era estranha. “[Macau] era um projeto colonial, as pessoas vinham para a colónia e falavam a língua administrante. Portugal sempre entendeu que o cantonês era uma língua de desprestígio”, lamenta.
Fonte: Sapo Notícias