Julgamento de Nuremberg: exposição mostra humanidade por trás da interpretação simultânea
‘1 Julgamento, 4 Línguas’ está exibida no Tribunal de Justiça de São Paulo e apresenta a modalidade de tradução que foi peça chave no processo que revelou crimes dos nazistas
De 20 de novembro de 1945 até 1 de outubro de 1946, aconteceu o julgamento de Nuremberg, na Alemanha, que revelou ao mundo os crimes e atrocidades cometidos pelo Terceiro Reich durante a Segunda Guerra Mundial. Para que as audiências ocorressem, foi elaborada a primeira interpretação simultânea oficial no mundo, com fones de ouvido, microfones, cabos e cabines de vidro. Eram 36 intérpretes, que traduziam interrogatórios e depoimentos em inglês, francês, russo e alemão.
Com curadoria da intérprete alemã Elke Limberger-Katsumi, a mostra “1 Julgamento, 4 Línguas” chegou pela primeira vez ao Brasil no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. A exposição é apresentada não apenas em português, mas também nos quatro idiomas falados nas audiências de Nuremberg.
Formada por totens com biografias de intérpretes que trabalharam no caso, a mostra já foi exibida em dez países, entre eles Alemanha, Suíça, França, Grécia, Estados Unidos e Itália. Em São Paulo, a organização é da AIIC Brasil, capítulo brasileiro da Associação Internacional de Intérpretes de Conferência, que completa 70 anos em 2023.
A educadora da exposição, Pauline Mingroni, explicou a Opera Mundi que a interpretação simultânea, foco da exposição, foi “importante para que a Justiça acontecesse, para que os réus pudessem entender o que estava acontecendo e também se defendessem”.
“Antes do julgamento, o sistema de interpretação era consecutivo, uma pessoa falava, todos escutavam na língua original, e depois a outra pessoa traduzia, e assim por diante”, explicou.
A educadora completou, afirmando que, em Nuremberg, “havia um outro contexto, que reunia mais países e que era mais urgente”. Portanto, “o julgamento que não durou um ano iria durar quase cinco anos utilizando o método antigo”.
A humanidade e a barreira linguística
A interpretação simultânea foi, dentro do contexto de Nuremberg, não apenas uma inovação tecnológica, mas também uma chave para o processo. Uma barreira linguística foi quebrada, permitindo que as atrocidades cometidas pelos nazistas fossem compreendidas em toda a sua amplitude pela comunidade internacional.
Ao abordar o método de interpretação, em contraste com a tradução, Mingroni lembrou: “somos humanos, temos tom de voz, temos emoção, temos tudo isso”. E afirmou à reportagem que, quando uma pessoa interpreta, ela “precisa realmente sentir e conseguir passar a mensagem adiante. Essa função da interpretação envolve o lado humano também”.
Diversos intérpretes foram refugiados da Alemanha nazista, pessoas que tiveram seus familiares condenados ou executados pelo Terceiro Reich, e se refugiavam em outros países, como Estados Unidos, Reino Unido, França e União Soviética.
Entre as diversas histórias abordadas dentro da exposição, destaca-se a de Evgenia Rossof (1916-1967), intérprete de inglês e russo para o francês, que foi presa política e passou pelo campo de concentração de Ravensbruck, tendo trabalhado de forma forçada na fábrica da Siemens. Durante seu tempo dentro do julgamento, criou retratos artísticos de nazistas que estavam sendo julgados, utilizando de traços fortes e sombras.
Além dela, há também Hugh Wolfe Frank (1913-1988), que fugiu para a Inglaterra em 1936 e se tornou um inimigo estrangeiro, recebendo cidadania inglesa apenas após o fim da Segunda Guerra Mundial. Intérprete do inglês para o alemão, ficou conhecido como “voz da condenação”, por interpretar em tempo real as sentenças para os nazistas enquanto elas eram proferidas pelo juiz britânico Geoffrey Lawrence.
Serviço:
Exposição: 1 Julgamento, 4 Línguas
Data: 10 de março a 10 de abril de 2023. Segunda a sexta, das 13h às 17h.
Local: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Praça da Sé, s/nº – Centro Histórico de São Paulo
Deixe uma resposta
Você precisa fazer o login para publicar um comentário.