Comunidade Ibero-Americana, por José Marques de Melo
Comunidade Ibero-Americana
José Marques de Melo
02/05/2014
Crédito:Leo GarbinA primavera europeia sacudiu a comunidade ibérica das ciências da comunicação, neste início de 2014. Ela foi mobilizada pela invasão de latino-americanos e luso-africanos, que reafirmaram o compromisso assumido, em São Paulo (2011) e Quito (2013), de frear o ímpeto anglo-devorador que atemoriza o nosso campo do conhecimento.
Se as palavras proferidas pelo português Moisés Martins, na abertura do II Congresso Mundial de Comunicação Ibero-Americana, realizado na histórica cidade de Braga, Portugal, ecoarem como as trombetas dos centuriões romanos, ali acantonados, séculos atrás, podem aspergir novas fragrâncias, como diria o poeta, daquele jardim aonde se vem lutando para cultivar a última flor do Lácio.
“Uma língua que não se esforce para dizer os avanços do seu tempo, e também as suas contradições e inquietações; uma língua que não se esforce para dizer os bloqueios e os impasses da sua época; quero dizer, uma língua que não tenha pensamento, é uma língua que não cria conhecimento. E, se não fizer, se não criar conhecimento, é uma língua arcaica, que estiola e acaba por morrer.”
O Congresso Ibero-Americano de Ciências da Comunicação responde a este desafio, enfatizou Martins: “concorrer para tornar as línguas, portuguesa e espanhola, línguas de pensamento e línguas de cultura e, em consequência disso, línguas de conhecimento.”
Trata-se de impasse escamoteado por acadêmicos enclausurados nas agências nacionais de fomento científico, que vêm confundindo a necessidade de veiculação do nosso conhecimento de ponta, em fóruns anglófonos, com estratégias para a disseminação do conhecimento novo, socializando-o no interior das nossas comunidades acadêmicas.
O resultado dessa política daninha, supervalorizando o conhecimento veiculado em inglês, no âmbito das ciências sociais aplicadas, acarreta efeito letal nos espaços nacionais ou regionais onde se pesquisa e divulga o saber comunicacional. Mais grave ainda é a miopia dos nossos avaliadores institucionais que aplicam, sem refletir e sem resistir, os critérios hegemônicos das ciências biológicas ou afins, causando malefícios incalculáveis ao progresso das disciplinas onde língua e conhecimento, cultura e difusão, constituem espaços contíguos, autênticos vasos comunicantes.
O eco dessa anomalia repercutiu, ainda que timidamente, na última reunião dos coordenadores de pós-graduação em comunicação, realizada em São Paulo. Mas, falta sensibilidade aos que exercem papel de liderança alertarem os gestores de C&T sobre o impacto dessa distorção. Permanecendo de braços cruzados, corremos o risco de definhar e perder visibilidade no mapa cognitivo.
Jornalista, professor universitário, pesquisador científico, consultor acadêmico, autor de diversos livros, foi docente da ECA-USP e é atualmente o titular da Cátedra Unesco de Comunicação na Universidade Metodista de São Paulo (www.marquesdemelo.pro.br).
Fonte: Portal Imprensa
Deixe uma resposta
Você precisa fazer o login para publicar um comentário.