Sambas-enredo em libras incluem comunidade surda no carnaval carioca
Rio — O ritmo que embala o carnaval na Marquês da Sapucaí foi parar na internet com uma nova linguagem. A Subsecretaria da Pessoa com Deficiência, numa parceria com a empresa All Dubbing Group, divulgou no canal da prefeitura no YouTube a tradução dos sambas-enredo das 14 escolas do Grupo Especial para a Língua Brasileira de Sinais (Libras). Coordenadora do projeto, Viviane Pinheiro diz que o trabalho não se restringiu a divulgar as músicas.— Nós pegamos a sinopse do samba, visitamos os barracões e conversamos com as pessoas das agremiações, para que elas passassem para a gente o que cada verso daquele samba quer dizer. Então o surdo, quando vê essa tradução, compreende o que vai ser mostrado lá na Avenida — disse Viviane.
Segundo ela, a tradução encontrou algumas barreiras como no trecho da letra da Mangueira: “Brasil, o teu nome é Dandara, tua cara é de cariri”.
— O intérprete Ricardo Boaretto, que é surdo, foi pesquisar com os amigos surdos lá do Nordeste, porque achamos que Cariri fosse a cidade. Porém, descobrimos com o compositor que ele se referia aos índios cariris. A estratégia do Ricardo foi fazer do perfil dele o Brasil. Então, o intérprete fez o sinal de índio com a mão no rosto, como se ele tivesse descendo, vindo do Nordeste — explicou Viviane.
O desafio não parou por aí. Ele precisou ainda do apoio do intérprete e do compositor da Mangueira, para entender as metáforas e o contexto da música. Graças à dedicação dele, parte da comunidade de surdos — que, de acordo com o Censo de 2010, chega a mais de dois milhões no país — poderá entender melhor o que se passa na Sapucaí.
— Antes, eu via o desfile e achava lindas as fantasias coloridas, mas não entendia nada, tinha uma barreira ali. No ano passado, quando houve uma tradução, eu fiquei emocionado. O conhecimento chegou, e, agora, eu estou nesse mundo — disse Ricardo, em libras.
— A letra da São Clemente fala sobre Hollywood, e o sinal de Hollywood não tinha aqui no Brasil. Eu tive que estudar e verificar qual é o utilizado lá fora — contou Alyne.
Para o intérprete Igor Mesquita, que ficou com “Xangô”, do Salgueiro, o que deu trabalho foram os termos e as palavras em iorubá como “Aláàfin de Oyó”, “Olori Xangô” e “Obá”. Assim, ele precisou recorrer à candomblecista Luciana Andreia.
— Como não era algo comum para mim, eu precisei mergulhar nessa cultura para conseguir passar esse universo para a comunidade surda. Assim, o sinal da orixá Obá ficou sendo uma referência ao sacrifício que ela fez por amor a Xangô, quando corta a própria orelha. Por isso, o gesto é tampando a orelha — explicou Igor.
Fonte: O Globo
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