O português e o mercado de línguas

Marcos Bagno

O Brasil ocupa hoje a 7a posição entre as maiores economias do mundo. Com seu território continental, é o 5o maior país e o 5o em população. Com nossos mais de 190 milhões de falantes, o português brasileiro é a 3a língua mais falada do Ocidente, atrás somente do espanhol e do inglês. No entanto, nossos governantes até hoje não despertaram para a relevância das línguas no atual mercado globalizado. O português brasileiro cresce de importância no mundo por pura inércia, arrastado pela projeção do país no cenário mundial. Embora tenhamos 85% dos falantes de português no mundo, não temos nenhuma política linguística sistematizada, planejada, para tornar nossa língua um bem de exportação capaz de fazer aumentar ainda mais o nosso PIB. Já Portugal, cinquenta vezes menos que o Brasil e com uma população inferior à da cidade de São Paulo, tem 17% de seu PIB constituído por produtos linguísticos. Na comparação, perdemos de longe para os portugueses, que são há muito tempo muito mais agressivos na promoção de sua língua no exterior. Na UNAM, a Universidade Autônoma Nacional do México, está o maior contingente de aprendizes de português no mundo e tudo levaria a crer que o português brasileiro seria o objeto de desejo dos mexicanos. No entanto, o Instituto Camões, órgão oficial da política linguística portuguesa, ocupa um andar inteiro no centro de línguas da UNAM, enquanto o português brasileiro não recebe nenhum apoio institucional oficial e são os professores brasileiros no exterior que são obrigados a se desdobrar para levar adiante a difusão da nossa língua.

O Brasil poderia muito bem ocupar, no tocante à língua portuguesa, o mesmo papel que ocupam os Estados Unidos no tocante ao inglês. Existe uma Commonwealth, comunidade internacional de países de língua inglesa, da qual os Estados Unidos não fazem parte. Apesar disso, o inglês que impera no mundo é o inglês americano, por razões mais do que óbvias, sem dar a mínima bola para a política linguística do Reino Unido, que também é forte. O Brasil, no entanto, assume uma postura colonizada, de subserviência às decisões linguísticas de Portugal. Por exemplo, os livros didáticos brasileiros continuam estampando até hoje uma norma-padrão abissalmente distante do verdadeiro português brasileiro urbano culto. A ridícula proibição de começar frase com pronome oblíquo só existe porque os portugueses não falam assim. Resultado: 192 milhões de pessoas são obrigadas a seguir uma regra que é natural, espontânea, intuitiva para meros 9 milhões e meio que vivem do outro lado do Atlântico. Ninguém precisa proibir os portugueses de começar frase com pronome oblíquo: a fonologia da língua deles não permite isso, ao contrário da nossa.

O futuro do português no mundo depende do Brasil, mas para isso é necessário empreender pelo menos duas ações bem planejadas e executadas: abandonar a ideia jurássica de que só os portugueses falam bem a língua e reconhecer a legitimidade das opções genuinamente brasileiras de uso da língua, que é tão nossa quanto dos portugueses e até mesmo, se levarmos em conta a população, muito mais nossa do que deles!

Fonte: Coluna de Marcos Bagno para a revista Caros Amigos.

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