O falar paraense – a mistura mais evidente entre a língua portuguesa e línguas indígenas
O que você sabe sobre o falar paraense? Égua, vamos descobrir? Aqui, uma breve análise do modo de falar do Pará.
Eu devo admitir que pouco sei sobre o Pará, além do que estudei na escola, muitos anos atrás. O Pará é um estado que nunca visitei, e também infelizmente não conheço nenhuma pessoa de lá. Mas, para dar um pouco de contexto e informação básica, aqui vai:
População: cerca de 8 milhões;
Tamanho: 1.247.950,00 km²;
Localização: Norte do Brasil, fronteira com os estados do Amapá, Roraima, Amazonas, Tocantins, Mato Grosso e Maranhão.
O Pará, além de ter sido assunto nas redes sociais por causa da novela A Força do Querer (o sotaque paraense imitado pelos atores globais foram duramente criticados – pena que não fizemos nosso vídeo antes para eles usarem como referência!), é também berço de muitos estilos musicais como carimbó, lambada e o tecno brega. Nomes como Fafá de Belém, Waldemar Henrique, Dona Onete, Banda Calypso e Felipe Cordeiro também catapultaram a cultura paraense mundo afora. E, para não falar que não falei das flores, o açaí também é outro patrimônio desse estado cheio de cultura e delícias, como o pato no tucupi.
Influências luso-indígenas
Voltando ao modo de falar paraense, uma grande influência vem de Portugal, mais especificamente do norte, lugar de origem do som chiado: o s com som de X, em palavras como mesmo, ou ao fim de sílaba, como em folhas. A influência portuguesa também refletida no uso do tu, que por sinal é conjugado de forma correta, diferentemente de outras regiões do Brasil que utilizam o tu e conjugam na terceira pessoa.
Já a outra herança no falar paraense tem muito a ver com os povos indígenas que ali habitavam e, em alguns casos, ainda habitam. Palavras como carapanã e igarapé vêm justamente da língua tupi, e são utilizadas até hoje.
Uma outra característica marcante do sotaque paraense é a forma de mais nasal de falar, muito maior que em outros lugares do país.
É égua!
Uma gíria muito usada no Pará é égua. Você sabe que está no Pará quando ouve égua para todo lado!
“Égua, mano, tu não vais acreditar na quantidade de carapanã que tinha no igarapé. A coisa ficou ralada lá à noite.”
égua: expressão de espanto, “vírgula do paraense” dita em toda frase, seria o equivalente ao “poxa” ou “caramba”.
carapanã: mosquito, pernilongo
igarapé: rio pequeno, riacho
ralada: feia, difícil (situação)
Mana(o)!
“Mana, tu viste a facada que está esse sapato? É muita bufunfa pra tanta caboquice. Só sendo muito buiado mesmo.”
facada: algo está muito caro
bufunfa: dinheiro
caboquice: extravagância, comportamento de quem quer chamar a atenção
buiado: com muito dinheiro
Eu particularmente adorei a utilização do mana. Em São Paulo é muito comum a forma masculina mano, que também tem uma forma feminina que seria o mina, mas essa seria a gíria para menina ou uma forma de denominar a namorada de alguém, ou seja, sem o sentido de irmandade como o mana possui (que provavelmente vem de hermana como o mano vem de hermano).
Bacana foi ouvir também a história de um amigo de uma colega aqui da Babbel, que se mudou para o Pará:
“Aqui (no Pará) se fala muito mano e mana. No meio LGBT, é bem comum usar o termo manapara falar uns com os outros. Meus amigos e eu tínhamos esse costume, hora ou outra soltávamos um ‘Mana! Que saudade!’. Mas, em Minas (LINK), as pessoas não usam muito esses termos, então fora as conversas entre amigos, eu praticamente não falava assim com ninguém. Como aqui (no Pará) eu ouvia muitas pessoas falando assim, comecei a falar também. Um dia, a menina que trabalha comigo me disse: “Mano, você tá vendo muita novela mesmo (se referindo à novela A Força do Querer), já tá até falando mana!”. Eu achei engraçado, porque embora eu assistisse à novela religiosamente, o motivo era outro. Então, expliquei para ela: ‘Não, mana, é que no meio LGBT nós usamos mana entre a gente. E como aqui todo mundo fala assim, acabei aproveitando para falar também, porque acho divertido!’”
Seria mana uma das gírias mais feministas do Brasil? Acredito que o conceito de irmandade entre as mulheres com certeza deveria ser refletido no falar também. Eu, com certeza, vou adotar!
Chega de caboquiar!
E você, o que curtiu mais sobre o falar paraense? O ritmo? As gírias? A descoberta de mais um viés da cultura brasileira?
No fim, os sotaques e dialetos são nada menos do que o espelho vivo da história e cultura locais, que valem não só serem estudados como também apreciados. É parte de todos nós.
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