O Dicionário Português-Renano e a valorização das línguas brasileiras: entrevista com André Kuster-Cid

Editorial IPOL
 

O Hunsrückisch é língua cooficial nos municípios de Antônio Carlos, em Santa Catarina, e Santa Maria do Herval, no Rio Grande do Sul e agrega uma extensa comunidade linguística no Brasil.

No momento em o governo brasileiro, através do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) conduz a implementação da Política do Inventário Nacional da Diversidade Linguística (INDL) criada pleo Decreto 7. 387 de 09 de dezembro de 2010, e no momento em que municípios brasileiros reconhecem as línguas de seus cidadão através de políticas de cooficialização, como é o caso de Antônio Carlos, que agora implementa ações em prol do Hunsrückisch, o lançamento do Dicionário Português-Renano em Domingos Martins, no Espírito Santo,  representa um estímulo ao desenvolvimento dessas e outras politicas linguísticas  de promoção e valorização das línguas brasileiras.

Como agente e co-partícipe na formulação dessas e outras politicas linguísticas, o IPOL saúda a iniciativa da publicação e entrevista seu organizador, o pesquisador André Kuster-Cid.

E: Porque o título do dicionario é Português-Renano e não Português-Hunsrikisch?

O nome do dicionário é “Dicionário Português-Renano (“Hunsrikisch”). A escolha do nome “Renano” se deu por 3 razões principais:

a) Não existe nem nunca existiu nenhuma unidade política chamada “Hunsrük”. O nome Hunsrück é um conceito geográfico, como “Serra da Mantiqueira”. A província alemã de onde vieram a maioria dos alemães para o Brasil chama-se “Prússia Renana”.

b) Na Dialetologia Germânica não existe nenhum dialeto “Hunsrück”. O que “Hunsrück” é parte da família de dialetos conhecidos como Dialetos Franco-Renanos, que inclui também o Luxemburguês e o Hessiano, povos que também imigraram para o Brasil  mas que NÃO vieram do Hunsrück.

c) Toda língua tem seu endônimo (o nome da língua da própria língua) e seu exônimo (o nome da língua em outras línguas). Assim, não dizemos que alguém fala “nihongo”. Dizemos que fala japonês. A palavra “hunsrik, hunsrikisch, hunsriqueano” são pouco eufônicas por serem estranhas à Fonologia do português brasileiro. Não existem palavras em português com a sequência consonantal “nsr”.

A palavra “Hunsrück” é difícil de ser lembrada por não falantes, o que complica  sua retenção por políticos, autoridades culturais e população em geral.

Assim que introduzimos o nome mais eufônico “língua renana” em nossos estudos e trabalhos, a consciência a respeito dessa língua e desse povo aumentou muito. “Renano”, “Pomerano”, “Italiano”: as 3 principais línguas de imigração. Fácil de falar e de lembrar.

E: Como se deu o uso da internet para a organização do dicionário?

O uso da internet foi fundamental. Através da rede social “facebook” foi criada a comunidade Hunsrikers do Brasil. Nessa comunidade Hunsrikers/Renanos de todo o Brasil partilham palavras, comparam significados, tradições. Além de aumentar nosso conhecimento sobre nossa própria língua, estabeleceu-se um laço de camaradagem dentre os vários colaboradores, todos citados como autores no dicionário.

E: Você tem trabalhado com crianças e jovens? Se sim, eles querem aprender o hunsrükisch? O que normalmente dizem? Se não, você pensa em alguma ação destinada a essa nova geração? Qual? Por que?

Por iniciativa da Secretaria de Educação de Domingos Martins-ES foi iniciado em 2012 o ensino da língua renana (hunsrikisch) com ênfase na ludicidade e no resgate cultural. As crianças gostam das aulas e através do conhecimento de sua história, passam a ter mais orgulho do que são e consequentemente, maior autoestima. Em 2014 aumentou-se o número de horas semanais para 4.

E: Qual a relação entre a preservação do Hunsrükisch e a conservação e o fortalecimento da cultura dos imigrantes alemães no Espírito Santo? 

Em minha opinião, a preservação da cultura Hunsrükisch/Renana é fundamental para a preservação da cultura germânica no ES. A identidade regional germânica é muito mais forte que o vago conceito “alemão”. Daí a tão forte preservação no Espírito Santo da identidade pomerana. Pensar que a cultura alemã é homogêmea é como confundir as culturas bahiana e gaúcha. Ambas brasileiras, mas ambas diferentes.

E: Na sua opinião, quais politicas linguisticas podem ser implementadas para fortalecer o Hunsrükisch?

Principalmente políticas de conscientização linguística. Os brasileiros precisam saber que existe uma língua e uma cultura brasileira compartilhada por milhões de pessoas, o perigo de extinção em que se encontra e a riqueza que possui. Muito importante também é sensibilizar os falantes que falam uma língua independente, o renano (hunsrikisch), que não é um alemão errado, mas uma língua  com suas próprias características.

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