Mapeamento linguístico da Angola
Entrevista sobre a situação do mapeamento linguístico angolano
Qual é o seu ponto de vista sobre a problemática linguística em Angola, uma vez que tem sido motivo de vários argumentos, até mesmo de polêmicas no seio social, político, acadêmico e não só?
Acho que já perdemos muito tempo com polêmicas à volta das línguas nacionais. Precisamos sim de parcerias e não de polêmicas. Parcerias que contribuam para a utilização dessas línguas no processo de desenvolvimento do país, de uma forma geral.
Quantos idiomas existem e quais são os mais falados?
Para o Instituto de Línguas Nacionais, é sobre elas que este instituto trabalha e que falarei a seguir : existem no país três grupos de línguas : Khoisan, Vátwa e Bantu. As línguas pertencentes a cada um desses grupos desdobram
-se num certo número de variantes. Por outro lado, cada língua possui a sua variante padrão. A grande dificuldade que se coloca nalguns casos é a aceitação, por parte dos falantes, da diferença que os linguistas fazem entre língua e variante.
Até Maio de 1987, apenas seis idiomas tinham o alfabeto aprovado a título experimental, pela Resolução no 3/78, do Conselho de Ministros. É caso do Kikongo, Kimbundu, Umbundu, Cokwe, Oxikwanyama e Mbunda, e as respectivas regras de transcrição. De lá para cá, o que foi feito em relação às demais línguas nacionais?
Em 1980, o Instituto Nacional de Línguas publicava a obra «Histórico Sobre a Criação dos Alfabetos em Línguas Nacionais» que tornou possível esboçar, pela primeira vez, os sistemas fonológicos e projetos de alfabetos das línguas Kikongo, Kimbundu, Cokwe, Umbundu, Mbunda e Kwanyama (Oxikwanyama).
Mais tarde, isto é, em 1985, o Instituto de Línguas Nacionais procedeu à revisão dos referidos sistemas fonológicos e projetos de alfabetos, que culminou com a elaboração de uma brochura intitulada «Esboço», nunca até aqui publicada.
Foi assim que através da Resolução no 3/87, de 23 de Maio de 1987, o Conselho de Ministros da República de Angola aprovou, a título experimental, os alfabetos das línguas nacionais Kikongo, Kimbundu, Cokwe, Umbundu, Mbunda e Oxikwanyama, e as suas respectivas regras de transcrição.
Passados 27 anos, após a sua aprovação, chegamos à triste conclusão que os alfabetos das línguas nacionais e suas respectivas regras de transcrição, são, quase sempre, desrespeitados, quer seja ao nível da imprensa escrita ou da literatura, sobretudo. Não importa neste mo- mento encontrar culpados. Importa sim recuperar o tempo perdido e inverter o quadro.
De Fevereiro de 2011 a Junho de 2012, o Instituto de Línguas Nacionais, em parceria com o Centro de Estudos Avançados de Sociedades Africanas (CASAS), realizou três workshops que culminaram com a publicação de uma pequena obra intitulada Harmonização Ortográfica das Línguas Nacionais de Angola. Esta obra apresenta duas partes.
A primeira trata da revisão e atualização dos alfabetos das seis línguas Kikongo, Kimbundu, Umbundu, Cokwe, Mbunda e Oxikwanyama, e suas respectivas regras de transcrição, aprovados, a título experimental, pela Resolução do Conselho de Ministros da República de Angola, em 1987.
A segunda trata, pela primeira vez, das regras que comandam as divisões das palavras e da sua ortografia. As regras desta obra aplicam- se a todas as línguas Bantu do país e constituem um código econômico e prático que facilita a leitura e a escrita dessas línguas, utilizáveis nos vários domínios da vida nacional, bem como respondem a uma necessidade real de se substituírem as várias transcrições paralelas por uma escrita uniforme.
Qual é o ponto da situação linguística dos khoisans?
Os Khoisans não andam esquecidos. A sua língua tem sido objecto de estudo por parte do ILN. Está para breve a publicação de um trabalho sobre o alfabeto e a ortografia Khoisan, numa parceria entre o ILN e o Centro de Estudos Avançados de Sociedades Africanas (CASAS).
O ILN procedeu a recolha de dados sobre a situação linguística de cada província, excepto Cabinda e Bié. Quantas equipas participaram no processo e quais foram os resultados?
Um grande esforço para obtenção de dados relativos à situação linguística do país tem sido feito pelo ILN com os recursos que lhes são disponibilizados. Assim, foram já recolhidos, pelo ILN, alguns dados que, todavia, carecem de confirmação. Cabinda e Bié, bem como algumas províncias mais têm recebido missões do ILN. Há um primeiro levantamento que foi feito e cujos dados estão a ser analisados.
Como vai atualmente o processo nessas duas províncias?
Vai bem, a julgar pelos primeiros resultados.
Fale-nos um pouco mais do caso Cabinda
Grosso modo, a situação de Cabinda é caracterizada pelo Ifyote que, reagrupa 7 variantes : Iwoyo, Ikwakongo, Ilinji, Ikoce, Ivili, Kiyombe e Kisundi. Cada uma das sete irá beneficiar de estudos fonológicos e gramaticais.
Consta que a população de Cabinda propôs como referência ao ILN duas denominações locais: o Ifyote e o Ibinda. Porém o Ifyote acabou por ser votado. Como vai este processo e como caracteriza a situação socio-linguística naquela província?
É verdade. O Ifyote foi a designação escolhida para a língua falada em Cabinda. Este consenso surgiu numa reunião realizada em Cabinda entre o ILN, o INIDE, as Secretarias Provinciais da Educação e da Cultura de Cabinda.
Como é que a população local encara este grande desafio no domínio das línguas nacionais?
O que as populações desejam é fazerem da sua língua um verdadeiro instrumento de comunicação e um importante meio de ensino e aprendizagem. Se entendermos que uma língua é um veículo de ensino, logo, uma boa parte das culturas de Angola tem sido veiculada pelas línguas várias nacionais.
O que diz a Lei sobre Estatuto das Línguas Nacionais?
O projeto de Lei que aprova o Estatuto das Línguas Nacionais é um instrumento que tem como principal objectivo promover a inclusão social e fortalecer a unidade na diversidade e o pluralismo cultural e linguístico.
Que projetos existem atualmente para a padronização das línguas nacionais?
Falando de projetos propriamente ditos o Ministério da Cultura aprovou para o presente ano o projeto sobre “Mapeamento Linguístico de Angola”. Trata-se de trabalho de Levantamento de dados sociolinguísticos de cada província (incluindo todos os seus municípios e comunas), com vista a elaboração de um atlas linguístico de Angola. O projeto sobre Mapeamento Linguístico de Angola começou a ser esboçado em 2010 aquando da realização do IVº Encontro sobre as Línguas Nacionais, que decorreu na província do Uíje de 18 a 21 de Outubro de 2010, sob o lema “Unidade na Diversidade”.
Que ações existem ao nível da proteção jurídica das línguas nacionais de Angola?
O Projeto de Lei sobre o Estatuto das Línguas Nacionais encontra-se na Assembleia Nacional aguardando a sua discussão na especialidade.
Por outro lado, a política cultural aprovada pelo governo da República de Angola reconhece as línguas nacionais como um importante repositório e veículo da cultura angolana. Promove o uso das línguas nacionais em todas as esferas da vida nacional, e particularmente no sistema de ensino e na comunicação social, bem como encoraja a edição em línguas nacionais.
Que estudos foram realizados no domínio linguístico, onde foram realizados e quais foram os resultados?
O estado atual da investigação científica do ILN é o seguinte: 1990: Trabalho não publicado sobre gramáticas técnicas das línguas Kikongo (108p), Kimbundu (88p), Cokwe (97p), Umbundu (112p), oshikwanyama(124p) e Mbunda; Léxicos de base não publicados Português / Língua Nacional e Língua Nacional / Português;
Quais são de momento as grandes preocupações do ILN?
Garantir a formação em linguística africana, em geral e, Bantu e Khoisan, em particular, a razão de pelo menos 2 linguistas para cada língua; Garantir a execução dos seguintes projetos: a) Mapeamento linguístico de Angola; b) Harmonização ortográfica das línguas nacionais; c) Descrição gramatical; d) Elaboração de léxicos temáticos; e) Elaboração de dicionários; f) Recolha e tratamento da Tradição.
São tarefas fundamentais do Estado, dentre outras, «proteger, valorizar e dignificar as línguas angolanas de origem africana como patrimônio cultural e promover o seu desenvolvimento, como línguas de identidade nacional e de comunicação.
LÉXICOS TEMÁTICOS NÃO PUBLICADOS PORTUGUÊS |
Kikongo-Português/Português-Kikongo 139p |
Kimbundu-Português/Português-Kimbundu |
Cokwe-Português/Português-Cokwe 61p, 63p |
Umbundu-Português/Português-Umbundu 54p |
Oshikwanyama-Português/Português-Oshikwanyama 66p |
Mbunda-Português/Português-Mbunda 59p, 131p |
Léxicos temáticos não publicados Português/ Língua Nacional e Língua Nacional/Português |
Kikongo Kimbundu Cokwe |
Cálculo (Matemática) 21p 23p 24p |
Administração e Serviços públicos 48p 24p 46p |
Vida Econômica 16p 49p 85p |
Agricultura, Pesca e Pecuária 15p 34p 33p |
Linguística 6p 7p 6p |
Saúde 40p 79p 37p, 80p |
1985: Esboço Fonológica, Alfabeto. (Trabalho não publicado sobre fonologia e alfabeto das línguas Kikongo, Kimbundu, Cokwe, Umbundu, Mbundu e oshikwanyama |
Umbundu Oshikwanyama Mbunda |
Cálculo (Matemática) 25p 20p 20p |
Administração e Serviços públicos 46p 26p,47p |
Vida Económica 33p 68p 17p |
Agricultura, Pesca e Pecuária 32p F |
Linguística 6p 6p 6p |
Saúde 38p 77p 76p |
1980:História Sobre a Criação dos Alfabetos em Línguas Nacionais (Primeiro trabalho publicado sobre os alfabetos em línguas nacionais). |
Fonte: O Pais Angola
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