Preconceito linguístico
O que seria? Ele existe? Se sim, qual a sua natureza? Na sua coluna de dezembro, o linguista Sírio Possenti caracteriza o preconceito linguístico, apresenta elementos factuais para desqualificar suas bases e questiona o sentido de ‘falar bem’.
Um dos debates mais quentes do ano foi sobre um livro didático acusado de ensinar regras de português erradas (na verdade, ninguém leu o livro; foram lidas algumas frases soltas de uma das páginas de um dos capítulos). A acusação mereceu diversas manifestações de especialistas, que tentaram mostrar que uma língua é um fenômeno mais complexo do que parece ser quando apresentada apenas em termos prescritivos.
Fonte: Ciencia hoje
Um dos pequenos avanços da mídia (que, no quesito, representa grande parte da sociedade instruída) foi reconhecer que as teorias e as pesquisas linguísticas têm legitimidade. Mas acha que devem restringir-se à universidade. Para um linguista, tal posição equivale a sustentar que só se deve ensinar reprodução na universidade. Até o fim do colegial, deve-se ensinar aos alunos que as crianças são trazidas pela cegonha.
Um dos itens do debate foi o preconceito linguístico; questionou-se sua existência. Chegou-se a afirmar que a ‘defesa’ de traços da fala popular produziria como um dos efeitos um preconceito às avessas, contra os que falam corretamente. Foi uma das leituras mais desastrosas que a mídia conseguiu fazer da questão.
O que seria o tal preconceito linguístico? Ele existe? Se sim, qual a sua natureza? Se deve ser combatido, como todos os preconceitos, quais deveriam ser as armas de combate?
Talvez seja bom começar por uma definição de preconceito. A do Dicionário Houaiss é bastante esclarecedora. Segundo essa fonte, preconceito é “qualquer opinião ou sentimento, quer favorável quer desfavorável, concebido sem exame crítico”, o que em seguida é mais bem especificado: “ideia, opinião ou sentimento desfavorável formado a priori, sem maior conhecimento, ponderação ou razão”.
Na segunda acepção, o preconceito é definido como “atitude, sentimento ou parecer insensato, especialmente de natureza hostil, assumido em consequência da generalização apressada de uma experiência pessoal ou imposta pelo meio; intolerância”. Os preconceitos que se tornaram mais conhecidos e cujo combate é mais aceito são o racial e o de gênero.
A expressão ‘preconceito linguístico’ é mais ou menos corrente entre leitores de sociolinguística, disciplina que estuda o fenômeno da variação linguística, os fatores que a condicionam e as atitudes da sociedade em relação às variedades.
No fundo, o preconceito linguístico é um preconceito social. É uma discriminação sem fundamento que atinge falantes inferiorizados por alguma razão e por algum fato histórico.
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