1ª Conferência Nacional de Política Indigenista discute direitos e políticas públicas para os povos indígenas
1ª Conferência Nacional de Política Indigenista discute direitos e políticas públicas para os povos indígenas
A 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista teve início na manhã desta segunda-feira (14), em Brasília – DF, e se estenderá até quinta-feira (17).
Clique aqui e acompanhe as postagens da 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista em sua página no Facebook.
Clique aqui e baixe pdf com a programação.
Estão reunidos no Centro Internacional de Convenções de Brasília (CICB) os delegados indígenas escolhidos nas 26 Conferências Regionais realizadas durante o ano, além de representantes do governo, servidores públicos, membros de organizações indígenas e indigenistas, observadores e convidados. A Conferência tem por objetivo realizar a avaliação da ação indigenista do Estado brasileiro, reafirmar as garantias reconhecidas aos povos indígenas do país e propor diretrizes para a construção e a consolidação da política nacional indigenista.
Durante a abertura, o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, destacou a importância do evento, afirmando que “pela primeira vez, povos indígenas e governo sentam para debater, com franqueza, a política indigenista brasileira”. O Ministro lembrou que a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988 demarcou um novo horizonte para os povos indígenas do Brasil, mas que, para além disso, esses direitos precisam ser efetivados: “É preciso que juntos construamos o caminho para efetivar esses direitos, e precisamos começar impedindo retrocessos”. Nesse sentido, afirmou posição contrária à Proposta de Emenda à Constituição PEC 215: “Temos que dizer não à PEC 215. E posso afirmar que estamos juntos”, concluiu.
A representante indígena Sônia Guajajara, membro da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), cobrou do governo ações concretas que confirmem esse compromisso de defesa dos direitos dos povos indígenas na prática. Sônia lembrou o adverso contexto vivenciado hoje pelos povos tradicionais, destacando o sistemático ataque promovido por setores conservadores da sociedade, representados no Legislativo, que buscam o acesso, o controle e a exploração dos territórios tradicionais indígenas: “Hoje, nós temos 182 medidas anti-indígenas tramitando, e todos os dias sistematicamente elas vêm, no sentido de suprimir direitos, de retroceder direitos”.
Sônia cobrou do governo maior autonomia política para, de fato, defender os direitos dos povos indígenas: “A Funai precisa ter autonomia para poder cumprir a sua missão institucional e não ceder à pressão do agronegócio”, cobrou. E concluiu elencando as expectativas do movimento indígena diante desse atual momento de articulação e diálogo entre o governo e os povos indígenas representados nesta Conferência: “O nosso pacto, como um acordo na mudança da relação do Estado brasileiro com os povos indígenas é esse ato concreto, é o ato da assinatura dos territórios indígenas. Nós precisamos ser reconhecidos como uma estratégia de riqueza, uma estratégia política para o país, e não um empecilho como nós somos considerados. O pacto dessa conferência tem que ter demonstração concreta, aqui, com a presença de todos. A demarcação dos territórios que estão prontos para ser assinados já é um sinal. O outro é o decreto de criação de um Conselho Nacional de Política Indigenista. Nós temos que ter um Conselho que discuta e que dialogue, e não apenas uma comissão. Nós queremos a mesma força, a mesma fala e a mesma autonomia pra gente poder pautar, e não apenas para sermos pautados”.
Unidade política
O presidente da Funai, João Pedro Gonçalves da Costa, lembrou que a Conferência mobilizou, durante todo o ano, mais de 30 mil representantes indígenas em suas etapas locais e regionais. Além da sistematização das quase cinco mil propostas que serão apreciadas na Conferência Nacional, o presidente destacou a importância do evento para o fortalecimento dos povos indígenas, da Funai e de seus parceiros para a construção de uma unidade política que seja capaz de impedir o estabelecimento dos retrocessos em curso: “Esperamos que a Funai saia diferente, saia maior, mais forte, para enfrentar o dia a dia das políticas públicas, mas para enfrentar também os grandes debates. Nós precisamos sair com um acúmulo grande de um entendimento político. Por isso, não diferente das vozes dos povos indígenas que estão aqui de plantão, a Funai é contra peremptoriamente a PEC 215, e nós vamos estar juntos nesta Conferência, na rua, na luta, lá no Congresso contra a PEC ou contra qualquer passo atrás nos direitos dos povos indígenas conquistados até agora”, concluiu.
Estiveram também na mesa de abertura representantes dos povos e organizações indígenas das regiões nordeste, sul, centro-oeste, norte e sudeste, do Conselho Indigenista Missionário e do Ministério da Saúde.
À tarde, a programação segue com as mesas magnas “Direitos indígenas – ameaças e desafios”, composta pelo presidente da Funai, a procuradora da República Débora Duprat, o advogado indígena Luis Eloy Terena e o secretário executivo do Ministério da Justiça Marivaldo Pereira, e “Política indigenista hoje”, com a presença do presidente da Associação Brasileira de Antropologia Antônio Carlos de Sousa, o professor da UERJ Ribamar Bessa e a representante da Apib Sônia Guajajara.
Texto: Mônica Carneiro/ASCOM
Fonte: Funai
As ameaças aos direitos indígenas e seus principais desafios foram temas discutidos na 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista
“Direitos indígenas – ameaças e desafios” e “Política indigenista hoje” foram os temas debatidos nas duas mesas magnas do primeiro dia da 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista. Deborah Duprat, subprocuradora-geral da República e uma das debatedoras, ressaltou a capacidade de resistência e organização dos povos indígenas, que, segundo ela, vêm resistindo a uma série de ameaças dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. A subprocuradora destacou como uma das principais ameaças a formação de jurisprudência que vêm tentando diminuir os direitos indígenas, principalmente com relação ao marco temporal (data da promulgação da Constituição Federal para definir a demarcação de terras ocupadas pelos povos indígenas).
Outra grande ameaça citada pela subprocuradora foi a tramitação da PEC 215 no Congresso Nacional, que propõe retirar do Executivo a prerrogativa de demarcar terras indígenas, transferindo essa responsabilidade para o Legislativo. Deborah Duprat afirmou a inconstitucionalidade da PEC, informando que, caso aprovada pelo Congresso, ela não passaria pelo Supremo Tribunal Federal (STF). “O STF diz que é preciso garantir toda a tramitação da PEC no Congresso Nacional para que eles (deputados e senadores) tenham a chance de discutir e rever a proposta, mas também diz que se o Congresso insistir e aprová-la, o STF vai declarar sua inconstitucionalidade”.
O advogado indígena Luis Eloy Terena destacou que a Constituição Federal representou um “divisor de águas” para os povos indígenas, com o rompimento da tutela. Lembrou que, antes dela, os indígenas não podiam exercer seus direitos de cidadãos. “Até o cacique, para sair da aldeia, o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), e depois a Funai, tinha de dar autorização”. Outro ponto importante conquistado para ele foi o reconhecimento do direito sagrado e originário às terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas. “Se os direitos estão na Constituição Federal, é porque houve intensa mobilização das lideranças e luta pelo reconhecimento. Ela representa a resistência dos povos indígenas”.
Eloy avaliou, no entanto, que, apesar dos avanços, ainda há práticas de tutela e apresentou algumas petições de juízes que ainda citam a tutela para solicitar que a Funai intervenha em determinadas ações protagonizadas pelos indígenas. Com relação ao marco histórico que o STF usa como argumento para anular demarcações de terras indígenas, ele lembrou: “não estávamos na terra (no momento da proclamação da Constituição de 1988) porque ainda éramos tutelados. O próprio Estado retirou os povos indígenas de seus territórios”.
Antônio Carlos de Souza Lima, presidente da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) participou da segunda mesa magna, que discutiu a política indigenista. Souza Lima falou sobre o desafio de se traçar diretrizes para a política indigenista, pois “não há uma política indigenista, mas várias políticas indigenistas: de educação, de saúde, de terras, de meio ambiente e sustentabilidade, de assistências sociais”. Segundo ele, são políticas que não se falam, mas ele não vê sentido em querer juntar tudo novamente num órgão como a Funai. “Creio que é importante que cada vez mais espaços no Estado brasileiro tenham políticas para os povos indígenas”. Para o antropólogo, as participações em instâncias, conselhos são importantes, mas é preciso garantir a execução do que for decidido. “Ao convocar essa Conferência, as autoridades estão assumindo um compromisso. É fundamental que as medidas propostas saiam do papel”. E deixou um recado para os participantes: “o desafio é defender um conjunto de valores comuns a todos os povos indígenas, pois para certos poderes, dividir é uma estratégia.
Participaram ainda das mesas magnas, o secretário executivo do Ministério da Justiça, Marinaldo Pereira; o professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, José Ribamar Bessa Freire; e a coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, Sônia Guajajara.
A Conferência segue até quinta-feira (17), no Centro Internacional de Convenções de Brasília (CICB).
Texto: Ana Heloísa D’Arcanchy
Fonte: Funai