Livro reúne 21 artigos sobre colonização italiana no ES
Kamila é bisneta de imigrantes e teve o primeiro contato com a literatura italiana na universidade.
As manifestações culturais organizadas da colônia italiana começaram na década de 70 do século passado, quando se celebraram, em comunidades do interior, festas pela passagem do centenário da chegada dos imigrantes. Com as festas e sua cobertura na imprensa, começou a publicação de memórias, estudos e relatos
Uma coletânea de textos sobre a imigração italiana no Espírito Santo está em fase de edição e vai trazer visões diversificadas sobre o fenômeno migratório que mais influenciou o Estado do ponto de vista econômico, demográfico, cultural e outros, no final do século XIX. Tem o nome de Adeus Itália, está sendo organizado por Kamila Brumatti Bergamini e reúne trabalhos de 21 autores, inclusive europeus. Confira a entrevista com a pesquisadora.
Qual é a proposta da publicação?
KAMILA: A proposta do livro Adeus Itália é a de rememorar textos e/ou autores representativos do processo imigratório (fundamentalmente italiano) que se deu ao Espírito Santo na segunda metade do século XIX. É por isso que o livro conta, em sua maioria, com escritos não inéditos.
Qual o perfil dos autores dos artigos?
KAMILA: Os autores participantes são escritores, professores, jornalistas e estudiosos da imigração italiana ao Espírito Santo. Eles foram selecionados justamente por sua contribuição escrita e sua relevância ao tema.
Qual a origem deles?
KAMILA: O livro nasce de uma preocupação interna e independente com o processo imigratório. Temos vários autores que são professores universitários aqui e na Europa, mas não atrelamos nosso trabalho a nenhuma instituição em específico.
Qual é o seu envolvimento pessoal com as manifestações da cultura italiana no ES?
KAMILA: Sou formada em Letras e na Universidade (Ufes) tive contato sistematizado com a língua e a literatura italianas. Cheguei a escrever críticas literárias de autores conhecidos como Dante, Petrarca, Italo Calvino, para citar alguns. Em 2008, passei a estudar narrativas capixabas possivelmente associáveis ao universo italiano, sobretudo pelo discurso narrativo híbrido, com referências à mistura Brasil-Itália. Em 2012, veio o convite para coordenar Adeus Itália. Culturalmente e etnicamente, sou da terceira geração brasileira (oriundi) dos primeiros italianos que chegaram ao Espírito Santo. Inclusive, o projeto é para mim uma espécie de retorno a muitas vivências da infância.
O Brasil reconhece devidamente o Espírito Santo como um Estado onde ocorreu uma forte corrente migratória?
KAMILA: Sim e não. É fato que o Espírito Santo foi uma das principais rotas de imigração. Isso é reconhecido por escritores. Oswald de Andrade, por exemplo, já havia feito referência a isso na primeira metade do século XX. Porém o “não” se justifica na falta de atenção ao passado capixaba, aliás, a desatenção recai sobre todos os assuntos capixabas. Somos pequenos (no tamanho) e periféricos (na atenção) do Brasil. Temos pouca produção escrita e poucos autores de relevância nacional. Isso faz com que nossos temas e textos fiquem encapsulados no circuito cultural local. Daí a importância de um projeto como Adeus Itália, que se propõe reeditar materiais de edições esgotadas ou de difícil acesso. Nesse novo formato, esses textos possivelmente terão mais visibilidade dentro e, em consequência, fora do Estado.
Que vínculos institucionais ligam hoje o Espírito Santo à Itália por conta da presença da colônia italiana?
KAMILA: O vínculo é grande. Há uma série de iniciativas entre o Espírito Santo e a Itália para estreitar a ligação. São comandas, processos de reconhecimento de cidadania, verbas culturais. Não saberia dizer sobre todas nem como fazer para ter acesso a tais ações. Acho que a Secretaria de Cultura pode dar mais informações.
O que acha do valor documental das histórias de família, fenômeno comum no Espírito Santo?
KAMILA: Creio que a relevância é maior do que se imagina. Adeus Itália contempla essas histórias, sobretudo através dos textos literários. Os chamados “relatos de família” pormenorizam um novo padrão cultural, chegado ao estado com a imigração. Além disso, são verdadeiros historiogramas do nascimento das cidades do interior do Espírito Santo. É preciso rever preconceitos sobre esse tipo de produção escrita. Negligenciar as narrativas familiares é negligenciar uma parte da história capixaba.
Há muito ainda o que pesquisar e divulgar no Espírito Santo sobre o período da chegada dos primeiros imigrantes até hoje?
KAMILA: Sim. Nossa tentativa é justamente lançar luz a uma história pouquíssimo explorada. Associamos o processo de imigração a manifestações culturais festivas e achamos que é só isso: músicas, danças, comidas, roupas típicas e festa. É preciso trazer o discurso da imigração também para o campo acadêmico, fazendo as devidas associações sociológicas, etnográficas, econômicas e históricas. Falta-nos o espólio crítico da imigração italiana.
O que você acha, do ponto de vista de fidelidade, dos relatos feitos pelos imigrantes, dos dados oficiais sobre a colonização e da pesquisa acadêmica sobre o tema?
KAMILA: Os dados divergem em muito. A história escrita oficial que se tem até então ficou a cargo de pessoas com informações limitadas. Adeus Itália contribui em muito para corrigir dados e acrescentar informações omitidas. Penso que nossa publicação revisa grande parte dos dados sobre imigração italiana no ES.
Fonte: Faesa digital
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