Nova mistura de línguas é descoberta ao norte da Austrália
Uma nova língua que combina elementos do inglês com a fala indígena tradicional foi descoberta ao norte da Austrália, de acordo com um novo estudo. A língua agora conhecido como Light Warlpiri (Leve Warlpiri) é falada por cerca de 300 pessoas em uma remota comunidade do deserto, uns 400 quilômetros distante de Katherine, uma cidade localizada na região norte do país, disse Carmel O’Shannessy, um professora do departamento de linguística da Universidade de Michigan em Ann Arbor. O’Shannessy documentou a descoberta da língua Light Warlpiri no Journal Language.
O Light Warlpiri é tido como uma “língua mista” por misturar elementos de várias outras línguas: o Warlpiri tradicional, que é falado por cerca de 6 mil pessoas nas comunidades indígenas espalhadas pelo Deserto do Tannami; Kriol, uma língua crioula baseada no Inglês falada em várias regiões da Austrália; e o próprio inglês.
“A coisa mais impressionante sobre o Light Warlpiri é que a maioria dos verbos vêm do Inglês ou do Kriol, mas a maior parte dos outros elementos gramaticais da sentença vem do Warlpiri,” disse O’Shannessy para a LiveScience.
No inglês, a ordem das palavras geralmente indica a relação gramatical entre as várias entidades. Por exemplo, na frase “Mary saw Jim” (Mary viu Jim), é entendido que Mary é quem vê, pois precede o verbo. Na língua Warlpiri, entretanto, as palavras podem ser colocadas em qualquer ordem, e as interpretações gramaticais são baseadas em sufixos acrescentados aos substantivos, explica O’Shannessy. O Light Warlpiri representa uma mistura destas regras estruturais.
“No Light Warlpiri, você tem uma parte da língua que em sua maioria vem do Inglês e do Kriol, mas outra parte gramatical, a sufixação, vem do Warlpiri”, afirma O’Shannessy
Tempo ‘Não-futuro’
Outra inovação dessa língua recém-descoberta é uma palavra que se refere aos tempos presente e passado, mas não ao futuro. Por exemplo, no Inglês: “I’m” (eu sou) se refere ao “I” (eu) no presente, mas falantes de Light Warlpiri criaram uma nova forma, como “yu-m“, que significa “you” (você) no tempo presente e no tempo passado, mas não no futuro. Em outras palavras este auxiliar verbal se refere ao tempo ‘não-futuro’, que é uma forma que não existe nem no Inglês, nem no Kriol ou no Warlpiri tradicional.
“Esta estrutura não existe em nenhuma das línguas de onde se origina este novo código, o que é uma das razões porque nos o vemos como um sistema linguístico distinto, mesmo sendo derivado de línguas que já existem”, explica.
O’Shannessy descobriu o Light Warlpiri enquanto trabalhava em uma escola na região norte onde o Warlpiri tradicional é ensinado para crianças. Ela notou que alguns alunos pareciam trocar os idiomas durante as conversações.
“Depois de um tempo, eu percebi que essa troca acontecia em toda sentença e decidi investigar,” O’Shannessy conta. “Uma vez eu gravei as crianças falando, observei os padrões e pude ver que havia padrões bem definidos. Foi quando percebi que era um sistema próprio.”
A evolução da língua
O’Shannessy acredita que o Light Warlpiri emergiu nos anos 1970 e 1980, quando crianças começaram a trocar entre Inglês, Kriol e Warlpiri, misturando-as e criando uma língua mista.
“Parece que as pessoas que estão hoje com cerca de 35 anos de idade são as que criaram este sistema e trouxeram a inovação nos auxiliares verbais,” O’Shannessy conta. “Eles passaram para seus filhos, que provavelmente passarão para as gerações seguintes.”
Línguas mistas não são incomuns pelo mundo, mas este tipo de inovação gramatical vista no Light Warlpiri é considerado raro.
Outros exemplos de línguas mistas incluem o Gurindji Kriol, uma mistura de Kriol e Gurindji tradicional, falado pelas comunidades da região norte australiana; e Michif, falado pelas comunidades ao longo da fronteira dos Estados Unidos com o Canadá, e combinam estruturas verbais do Cree, língua Algonquin e estruturas substantivais do Francês Métis, um tipo de dialeto francês do Canadá.
Fonte: Science – NBC News
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