O ensino de línguas nacionais na Angola e sua expansão

De acordo com a definição da UNESCO, língua oficial é aquela utilizada no quadro das diversas atividades oficiais: legislativas, executivas e judiciais de um estado soberano ou território. É a língua consagrada na lei (através da constituição ou de lei ordinária), ou apenas pela via do costume, de um país, estado ou outro território como a língua adotada nesse país, estado ou território.

A(s) língua(s) oficial(is), cuja escolha depende de razões políticas, deve ser aquela empregada em todo e qualquer ato oficial referente ao poder público, seja de direito externo (tratados e convenções internacionais), seja de direito interno (constituição, leis ordinárias, atos políticos, sentenças judiciais, atos administrativos, discursos oficiais, etc.). A língua oficial será, em princípio, a língua falada pela população de cada estado ou território e consequentemente, será a língua ensinada nas escolas.

Na Angola, que tem a Língua Portuguesa como oficial, a questão idiomática é motivo de reflexão visto a ampliação do ensino da língua nacional “Umbundu”.

O programa radiofónico “Mukanda”, emitido aos domingos de manhã na emissora Ngola Yetu da Huíla, está animado, pois sua transmissão é realizada inteiramente no idioma umbundu e nele há um espaço para que os ouvintes enviem mensagens a amigos e familiares.

José Katimba, residente dos arredores da cidade de Lubango, acompanha a transmissão e tem vontade de telefonar para o programa a fim de saudar sua família, que vivem em Caluquembe, cidade onde não há o serviço de telefonia, mas é alcançado pelas ondas radiofônicas. Todavia, ele acaba por desistir por não falar fluentemente a língua materna umbundo. “Gostaria de mandar uma mensagem via rádio aos meus parentes e amigos do interior, onde não chega o sinal de telemóvel, mas não passa de vontade, porque esqueci como se fala a minha língua, por falta de prática. Mas entendo razoavelmente o umbundo”, diz ele.

Muitos como José Katimba acabaram por esquecer da língua por causa da influência do meio, pela falta de prática e de interesse. Porém, há três anos a oportunidade de (re)aprender o Umbundu ou outra língua nacional está aberta, graças à inserção das mesmas no sistema de ensino na província de Huíla.

O processo, inciado nos anos 90, através da introdução das línguas em programas da grade de programação da Radio Nacional da Angola, apresenta resultados positivos, que motivam a expansão para mais escolas e mais níveis de ensino.

O professor universitário de história José Miúdo Ndambuca explica que a evolucão do ensino das línguas nacionais começou com a criação de programas e noticiários nos órgãos de comunicação social, especialmente na Televisão Pública e na Radio Nacional. O docente ainda lembra que a insersão das línguas no sistema de ensino a nível nacional suscitou muitos debates entre agentes culturais, pedagogos e acadêmicos, além de resistência por parte dos céticos, mas destaca a importância das línguas. “Todo o processo tem um princípio e a sua evolução. Como elemento ativo da campanha de influência para a introdução das línguas nacionais no sistema de ensino, estou satisfeito em ver um dos meus sonhos se tornando realidade. Isto confirma a valorização da nossa cultura”, declara.

Da experiência à consolidação

A fase experimental teve início há quatro anos, com a língua nianeca-humbe. E neste ano letivo, mais de 27 escolas, da primeira à 12ª classe, dos municípios de Lubango, Humpata e Chibia, vão ensinar os alunos a falar nianeca-humbe, umbundu e nganguela, numa altura em que planejaram a extensão e generalização para todas as instituições escolares da província. O coordenador do departamento da Direção Provincial da Educação, Ciência e Tecnologia, Ezequiel Kambindangolo, explica que o ensino de nianeca produziu resultados positivos e algumas aprendizagens, o que permitiu a inserção de umbundo e nganguela. “Estamos a criar condições para a generalização. O processo de ensino e aprendizagem não é uma especialidade por ser uma disciplina. Ou seja, ensina-se a língua e não na língua”, esclarece.

Ezequiel Kambindangolo assegura, durante o seminário dirigido aos professores de nianeca-humbe, umbundu e nganguela, que a Direção Provincial da Educação dispõe também de condições materiais, como livros das três línguas, além de tchokwe, cujo manual já está traduzido e elaborado, e cerca de 200 professores de línguas nacionais.

Professores formados

A formação de professores em línguas nacionais nianeca-humbe, umbundo e nganguela é uma das prioridades da Direção Provincial da Educação na Huíla, à luz da Reforma Educativa. Em seminário realizado em Janeiro no Lubango, 120 professores foram instruídos em metodologias adequadas para o ensino e aprendizagem, à luz do método Inovação do Ensino da Leitura (IEL). Ezequiel Kambindangolo explica que a formação se destina a preparar os professores para saberem trabalhar com os materiais disponíveis e ganhar competências linguísticas para saber ouvir, ler, escrever e falar na sua língua étnica.

O responsável do departamento de formação de quadros da direção provincial, António dos Santos, realça a importância do ensino das línguas nacionais no desenvolvimento da educação, transmissão de conhecimento científico e resgate dos valores culturais dos povos da Região Sul. “O Ministério da Educação assegura e promove as condições humanas, científicas, técnicas, materiais e financeiras para a expansão e generalização do ensino das línguas nacionais. Esta formação surge da necessidade de alargar o processo a mais escolas da nossa província”, afirma.

O professor de História José Miúdo Ndambuca defende um árduo trabalho na formação de mais professores, produção de manuais, consolidação e generalização das línguas já inseridas no sistema de ensino, como forma de contribuir para o resgate dos valores culturais e linguísticos do povo angolano. “Temos ainda um longo caminho a percorrer. Sou da opinião que em primeiro lugar devemos consolidar bem o que já começámos. Devemos passar do ensaio para avançar até à universidade”, defende, sugerindo que cada língua deve ser ensinada nas regiões que concentram grupos linguísticos maioritários.

José Miúdo Ndambuca incentiva os dirigentes a darem o exemplo, falando as respectivas línguas nacionais como forma de as valorizar. “A alma de um povo é a cultura e a chave da cultura é a língua, pela sua importância na interação dos seres humanos. Só através das línguas é possível transmitir a herança cultural, artística, económica, política ou familiar”, argumenta o especialista.

Namibe segue o ritmo

O sector de línguas nacionais da Direção da Educação do Namibe está interessado em partilhar experiências com os homólogos do sector da província da Huíla. O coordenador provincial, César Joaquim, reconhece que a província da Huíla está avançada três anos em termos de inserção e ensino das línguas nacionais no sistema de educação e na aplicação do método Inovação no Ensino da Leitura (IEL), preparação de recursos humanos e manuais.

“Estamos numa visita de troca de experiências no domínio das metodologias de ensino e formação. As línguas nacionais no ensino da Huíla já decorrem há quatro anos e é notória a maior mobilização de recursos humanos. Viemos aprender a pôr em prática na nossa região”, argumenta. O coordenador do Namibe afirma que o projeto-piloto do processo de inserção das línguas nacionais no sistema normal de ensino na província, realizado no ano passado, decorreu bem, apesar de algumas dificuldades relacionadas com a escassez de recursos humanos e de material didático.

Ele avalia de forma positiva a fase experimental da língua nianeca-humbe, que decorre nos municípios do Namibe, Bibila e Camucuio, com um total de 29 turmas. César Joaquim anuncia que a língua mucubal é a próxima a ser inserida no sistema de ensino, para a qual a comissão de tradução está criada. “Estamos preocupados com o resgate da língua mucubal pelo facto de ser falada apenas na província do Namibe. Há muita vontade dos agentes de ensino em ver as línguas nacionais a ser ensinadas nas escolas, devido à sua importância para a socialização dos cidadãos”, diz.

Fontes: Jornal de Angola, Angola Bela, Canal A.

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